Palavras-chave
metástase - metástase linfática - osteossarcoma - tíbia
Introdução
Os avanços no desenvolvimento de novos esquemas de quimioterapia e radioterapia, assim
como os avanços nas cirurgias ortopédicas oncológicas, melhorou o prognóstico dos
pacientes com osteossarcoma (OS), aumentando a sobrevida de 15% para mais de 60%.[1]
[2] No entanto, aproximadamente 40% dos pacientes apresentam recidiva e progressão da
doença com metástases frequentes para os pulmões e ossos.[2] Outros locais de comprometimento secundário, como os órgãos abdominais, linfonodos
ou retroperitônio são raros. Apesar dos avanços nas opções de tratamento, o prognóstico
dos pacientes com metástases incomuns permanece sombrio, com altas taxas de mortalidade.
O uso de novos esquemas de quimioterapia pode estar associado à indução de padrões
atípicos de disseminação e progressão da doença, possivelmente por favorecer a seleção
de diferentes fenótipos das células tumorais.[2] Apresentamos o caso de um homem adulto com envolvimento metastático incomum de osteossarcoma,
causado por uma grande massa retroperitoneal, um conglomerado de linfonodos inguinais,
com metástases hepáticas e ósseas sem recorrência local ou pulmonar.
Relato de Caso
Um homem de 46 anos de idade consultou-se por causa de dor no joelho esquerdo, com
irradiação distal para a perna. Os estudos de raios-X e ressonância magnética exibiram
uma lesão lítica da tíbia proximal, exigindo uma biópsia aberta confirmando o osteossarcoma
([Fig. 1A]). As tomografias do tórax, abdômen e pelve foram negativas para lesões metastáticas.
O tratamento neoadjuvante foi iniciado com 3 ciclos de doxorrubicina e cisplatina,
6 meses após a cirurgia de salvamento do membro com ressecção completa do tumor e
reconstrução com endoprótese tibial proximal. A histopatologia confirmou um OS tibial
proximal, com margens livres de tumor, e 30% de tumor viável, indicando uma resposta
de grau II A ao tratamento neoadjuvante.
Fig. 1 (A) H/E 40x. Tumor maligno com produção de osteoide correspondendo a um osteossarcoma.
(B) H/E 40x. Metástases de linfonodo de OS. Lâminas de células pleomórficas com necrose
extensa, mitose e osteoide abundante.
Posteriormente, o paciente completou 3 ciclos de quimioterapia adjuvante com o esquema
anterior, apresentando adequada tolerância ao tratamento e sem toxicidade. Após 1
ano do procedimento cirúrgico, apresentou episódios de linfedema do membro e dor.
A ultrassonografia Doppler descartou trombose venosa profunda e a TC abdominal revelou
linfadenopatias inguinais e ilíacas. A TC do tórax revelou um nódulo pulmonar inespecífico
menor que 1 cm. Na época, o serviço de cirurgia torácica não considerava como uma
lesão metastática. Posteriormente, foi realizada biópsia do linfonodo inguinal, a
análise histopatológica confirmou tumor maligno e metástases de OS ([Fig. 1B]).
Considerando que o paciente apresentava recidiva dos linfonodos e das partes moles
inguinais, sem recidiva local no sítio inicial do tumor, optou-se pela ressecção da
metástase. Durante a intervenção, foi evidenciada uma massa sólida de aproximadamente
10 cm de diâmetro na região inguinal esquerda, aderida à face lateral da bexiga, aos
vasos ilíacos externos, ao cordão espermático e ao ligamento inguinal. Apresentava
extenso comprometimento dos linfonodos inguinais, sendo realizada a dissecção linfonodo
inguinoilíaca esquerda, obtendo-se uma ressecção R2 da massa (devido ao comprometimento
das estruturas vasculares e da extensa fibrose das partes moles). O estudo histopatológico
identificou múltiplas estruturas nodais conglomeradas de 5 a 6 cm de diâmetro, consideradas
metástases com grande angioinvasão e extensão para os tecidos moles. Após essa intervenção,
foi realizada uma quimioterapia paliativa com a administração dos fármacos gencitabina
e docetaxel com 1 ciclo de tratamento.
Um mês depois, o paciente apresentou dor intensa no membro inferior esquerdo, além
de monoplegia, insuficiência renal aguda e hematúria. Uma ressonância magnética da
coluna lombossacra, revelou uma massa paravertebral anterolateral esquerda irregular,
no segmento lombar inferior que infiltrava o músculo psoas e o córtex anterior do
corpo vertebral L5 ([Fig. 2]).
Fig. 2 Ressonância magnética da coluna lombossacra, evidenciando uma massa nos tecidos moles
paravertebrais, infiltrando o corpo da vértebra L5 (seta).
Além disso, a TC tóraco-abdominal contrastada identificou múltiplas lesões hipodensas
compatíveis com metástases no parênquima hepático, ossos pélvicos e uma massa de aproximadamente
140 × 78 mm no músculo psoas ilíaco esquerdo, se estendendo da L3 à região inguinal,
circundando os vasos ilíacos interno e externo. Além disso, foram encontrados linfonodos
para-aórticos, inter-aorto-cava e ilíaco externo direito ([Figs. 3] e [4]).
Fig. 3 TC tóraco-abdominal em corte coronal, com uma massa de tecido mole infiltrando o
músculo psoas esquerdo com extensão para região inguinal (seta).
Fig. 4 TC abdominal em corte axial, com uma massa de tecido mole infiltrando o músculo psoas
esquerdo (seta).
Foi realizada biópsia dessa massa guiada por TAC, evidenciando envolvimento metastático
devido a um osteossarcoma de alto grau ([Fig. 5]).
Fig. 5 H8/e 10x. Trombos neoplásicos com matriz osteoide entre células malignas compatíveis
com OS metastático.
O paciente persistiu com agravamento clínico, evoluiu com trombose venosa profunda
no membro inferior esquerdo e tromboembolismo pulmonar agudo, hematúria persistente
e desidratação, falecendo dois anos depois do diagnóstico inicial de OS.
Discussão
A ocorrência de metástases faz parte do curso natural do osteossarcoma (OS), sendo
a metástase pulmonar a mais frequente.[1]
[3]
[4]
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[6]
[7] Usando a quimioterapia como parte do tratamento integral, em relação ao que foi
informado em 1975 por Jeffree et al,[8] houve uma mudança nos padrões usuais da metástase. Embora isso possa ser o resultado
de uma melhor identificação e também do relato de novos casos de OS, a melhora na
sobrevida dos pacientes com OS revelou novos padrões de metástases extrapulmonares,
particularmente no peritônio e linfonodos.[1]
[2]
[3]
[6]
[7]
[9] A literatura não é clara a respeito da epidemiologia das metástases linfáticas em
OS, a maioria das informações disponíveis vem de relatos de casos e séries de casos,
com uma incidência entre 4% e 11%.[1]
[6]
[7]
[9]
[10] A presença de micrometástases que podem levar à disseminação de OS também foi descrita,
o que poderia impactar nas taxas de sobrevida.[4]
Um dos aspectos mais importantes que afetam a sobrevida dos pacientes com OS, é o
desenvolvimento de metástases.[1]
[8]
[9]
[10] Parece que a presença de certas metástases poderia estar associada a variantes mais
agressivas do OS.[1]
[6]
[7]
[8]
[9]
[10] Presume-se que essa mudança no padrão usual da metástase extrapulmonar, seja o resultado
do uso de quimioterapias mais eficientes que visam certas células tumorais, deixando
espaço para variantes mais agressivas com maior potencial metastático.[2]
[3]
[4]
[5]
[9]
[10] Isso poderia explicar o resultado de linfonodo e metástases abdominais (especialmente
as retroperitoneais) que estão associadas à recidivas de difícil controle e alta mortalidade
no momento do diagnóstico.[2]
[3]
[9]
[10]
Este caso descreve um tipo de tumor ósseo agressivo e difícil de tratar, apresentando
uma baixa taxa de resposta à quimioterapia, com recorrência distante, eventualmente,
com desfecho fatal. Embora a presença de metástases em linfonodos seja incomum, a
ocorrência de metástases extrapulmonares está aumentando, portanto, é essencial entender
o escopo de um tumor que a ciência pode não ter totalmente compreendido.