Palavras-chave
articulação do joelho - artroplastia do joelho - ligamento patelar - patela - tendões
Introdução
A patela baixa é uma patologia definida como a diminuição da distância entre o ápice
inferior da patela e a superfície articular proximal da tíbia, num doente com sintomas
de gonalgia e deficit de mobilidade.[1]
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Está associada a gonalgia crónica, conflito mecânico da patela, insuficiência muscular
quadricipital e diminuição da amplitude articular.[1]
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Os achados anatomopatológicos chave são o encurtamento e aumento da espessura ligamentar,
fibrose intraarticular e da gordura de Hoffa, retração tecidular e fraqueza ou disfunção
do músculo quadricipital.[1]
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Existem vários métodos radiológicos para avaliar a altura patelar: índice Insall-Salvati, índice Blackburne-Peel e o índice Caton-Deschamps.[1]
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[5] Na descrição deste caso, os autores utilizaram o índice Caton-Deschamps, sendo que valores <0,6 indicam a existência de patela baixa.[1]
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Tanto os procedimentos cirúrgicos, como o trauma e imobilização do joelho predispõem
ao desenvolvimento de patela baixa.[1]
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[8] Estudos recentes mostram taxas de incidência de patela baixa após artroplastia total
do joelho de até 38%.[1]
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[9] Esta elevada taxa de incidência é devido à excisão excessiva da gordura de Hoffa,
manipulação agressiva do ligamento patelar e libertação do retináculo lateral da patela,
que por sua vez conduzem a fenômenos isquêmicos, cicatrização anômala e retração tendinosa.[1]
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Existem múltiplos procedimentos cirúrgicos descritos para o tratamento desta patologia
com impacto no aporte sanguíneo, no vetor de forças e no tilt patelar, com o objetivo de corrigir a etiologia de base e recuperar a altura normal
da patela, mas nenhum é o tratamento padrão.[1]
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[9] O objetivo deste caso clínico foi descrever uma técnica cirúrgica utilizada para
a correção do encurtamento e espessura do ligamento patelar.
Relato de Caso
Paciente de 73 anos de idade que apresentava rigidez do joelho com deficit de flexão
e, radiologicamente, patela baixa após artroplastia total do joelho direito. A limitação
funcional, segundo o Lysholm Knee Score, era de 16 pontos, com máximo de flexão de 45°, dor e fraqueza do aparelho extensor,
sendo resistentes ao tratamento conservador. Inicialmente, o índice de Caton-Deschamps era de 0,49 ([Fig. 1]).
Fig. 1 Radiografia lateral do joelho a evidenciar o índice Caton-Deschamps 0,49 no pré-operatório.
Técnica Cirúrgica e Reabilitação
Técnica Cirúrgica e Reabilitação
A doente foi submetida a um procedimento cirúrgico combinado de plastia do ligamento
patelar para alongamento e reforço com parte do tendão quadricipital. Ainda se procedeu
à substituição do polietileno da face articular superior da tíbia, por um de menor
espessura e o componente patelar foi removido.
Como o ligamento patelar se encontrava espessado, a técnica envolveu a divisão do
ligamento na sua espessura, obtendo-se um componente anterior e outro posterior de
igual espessura.[6] O componente anterior foi desinserido, distalmente, ao nível da tuberosidade anterior
da tíbia e o componente posterior, proximalmente, ao nível da patela[6] ([Fig. 2]). Com o joelho a 90° de flexão, fixaram-se os dois topos ligamentares com, pelo
menos, 5 mm de sobreposição com sutura absorvível[6] ([Figs. 3] e [4]). Um feixe do tendão quadricipital superficial, com cerca de 1 cm de largura e 10 cm
de comprimento, foi isolado ([Fig. 5]) e mobilizado distalmente para reforço do ligamento patelar[6] ([Fig. 6]). O local de excisão quadricipital é reforçado com suturas absorvíveis, apresentando
baixa morbilidade.[6]
Fig. 2 Esquema do procedimento cirúrgico: ligamento patelar foi dividido em dois, segundo
a sua espessura. O feixe anterior (azul-escuro) foi desinserido anteriormente ao nível
da tuberosidade anterior da tíbia, o feixe posterior (azul-claro) foi desinserido
ao nível do ápice distal da patela. Nota-se ainda a obtenção de feixe do tendão quadricipital
(cinzento). (1–Tendão Quadricipital; 2–Patela; 3–Ligamento Patelar).
Fig. 3 Esquema do procedimento cirúrgico: sutura dos dois feixes do ligamento patelar (azul-escuro
e azul-claro), com pelo menos 5 mm de sobreposição. De notar o reforço ligamentar
com feixe do tendão quadricipital (cinzento-escuro). (1–Tendão Quadricipital; 2–Patela;
3–Ligamento Patelar)
Fig. 4 Imagem intraoperatória a demonstrar a sutura dos dois feixes do ligamento patelar,
com pelo menos 5 mm de sobreposição.
Fig. 5 Imagem intraoperatória a demonstrar a mobilização do feixe do tendão quadricipital.
Fig. 6 Imagem intraoperatória a demonstrar o reforço do ligamento patelar com feixe do tendão
quadricipital. (seta amarela)
Durante o primeiro mês, a mobilização imediata e o tratamento de reabilitação foram
necessários para o fortalecimento quadricipital e evitar a recidiva de patela baixa,
estando limitado a carga parcial e flexão máxima de 45°.[6]
[9] O fortalecimento muscular e reabilitação articular foi mantido com o apoio da medicina
física e de reabilitação durante três meses. Aos seis meses de seguimento, os resultados
funcionais foram excelentes, com resultados funcionais de Lysholm Knee Score de 81 pontos, flexão máxima de 110° e índice Caton-Deschamps de 1,17 ([Fig. 7]). A doente retomou as suas atividades de vida diária após o primeiro mês pós-cirúrgico.
Fig. 7 Radiografia lateral do joelho a evidenciar o índice Caton-Deschamps de 1,17 no pós-operatório.
Discussão
A patela baixa é uma complicação devastadora do trauma ou cirurgia do joelho, sendo
essencial o diagnóstico e tratamento precoces, para o melhor resultado funcional.[1]
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Existem várias técnicas cirúrgicas descritas para correção de partes moles e ósseas,
contudo não existe um tratamento padrão para esta patologia.[1]
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A mobilização proximal da tuberosidade anterior da tíbia restaura a altura da patela,
mas não é aconselhada quando existe disfunção do músculo quadricipital e não corrige
o encurtamento e a espessura do ligamento patelar.[1]
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Há, no entanto, várias opções para o alongamento do ligamento patelar como o uso de
enxertos autólogos ou aloenxertos dos tendões isquiotibiais ou osso-tendão-osso e
o alongamento do ligamento patelar utilizando a técnica de Ilizarov.[1]
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[10] Mais recentemente foi descrita a plastia em Z modificada que apresenta algumas vantagens
em comparação com as outras técnicas.[3]
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A plastia em Z modificada tem as vantagens de obter maior alongamento e a manutenção
do alinhamento das fibras tendinosas, mantendo inalterado o vetor de forças e a vascularização
sanguínea.[6] Outras vantagens desta técnica cirúrgica são a prevenção de defeitos subcutâneos
e tendinosos, o que leva a menor risco de complicações e a uma reabilitação precoce.[6]
Segundo a literatura existente, o resultado clínico do paciente apresentado é semelhante
a outras variantes de plastia em Z, com a vantagem de manter o alinhamento das fibras
tendinosas e maior sobreposição entre os dois topos ligamentares, não alterando o
vetor de forças e diminuindo o risco de falência.[1]
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[10] Em comparação com os procedimentos ósseos, a abordagem cirúrgica é menos agressiva,
a reabilitação e a mobilização são mais precoces, apresentando também menor risco
de falência.[1]
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Existem várias técnicas cirúrgicas para o tratamento da patela baixa, contudo não
existe um tratamento padrão. A técnica cirúrgica apresentada tem como vantagens a
abordagem da patologia subjacente, facilidade de execução e reprodutibilidade, mobilização,
recuperação e regresso às atividades de vida diárias após o primeiro mês pós-cirúrgico,
como descrito no caso apresentado.