Palavras-chave
paralisia obstétrica - ombro - distocia - traumatismos do nascimento
Introdução
A paralisia obstétrica (PO) é definida como uma paralisia flácida parcial ou total
que acomete o membro superior do recém-nascido decorrente da lesão do plexo braquial
ocorrida no parto normal, e, mais mais raramente, no parto cesáreo, frequentemente
associada à distócia de ombros (DO). Também é definida como paralisia devido à lesão
recebida no parto, segundo os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS).[1]
A DO ou distócia de bisacromial se dá quando a apresentação é cefálica e o polo cefálico
já se desprendeu, porém os ombros não se soltam e não se observam quaisquer outras
dificuldades[2] ([Figura 1]).
Fig. 1 Distócia de ombros.
Apesar de rara, com incidência em < 1% dos partos, a PO é uma complicação grave, cuja
ocorrência aumenta consideravelmente para valores próximos de 6% em casos de fetos
com peso > 4.000 g.[3]
[4] São descritos como fatores associados a essa intercorrência a obesidade materna,
o pós-datismo e o diabetes gestacional.[3]
[4]
[5] É importante ressaltar que mesmo em fetos de peso < 4.000 g, a DO pode ocorrer,
principalmente quando existe algum grau de desproporção entre o feto e a pelve materna.[2]
A DO associa-se a complicações maternas, sendo as mais comumente descritas lacerações
do canal de parto, atonia uterina com hemorragia, disjunção da sínfise púbica e, eventualmente,
rotura uterina.[2]
As complicações fetais são lesões de plexo braquial e fratura de clavícula e úmero,
podendo evoluir para óbito intraparto ou neonatal. O plexo braquial é formado pela
união dos ramos anteriores das raízes de C5, C6, C7, C8 e T1, emergindo entre os músculos
escaleno anterior e médio. Em muitos casos, recebe a contribuição de C4, quando é
chamado de pré-fixado. A situação na qual essa contribuição é de T2 chama-se de pós-fixada.[6] Em geral, o plexo braquial é lesado pela tração excessiva durante o trabalho de
parto, o que pode ocorrer em até 15% dos recém-nascidos que apresentem distócia de
bisacromial.[7] Em grande parte dos casos, a lesão se resolve em entre 6 e 12 meses, mas casos severos
podem precisar de cirurgia, com risco de dano permanente em até 10% das ocorrências.[8]
Galbiatti,[9] Galbiatti et al[6] e Albertoni et al,[10] em estudos sobre PO, trazem bases anatômicas e fazem um breve histórico dessa lesão.
Os autores destacam que esta é reconhecida desde a antiguidade na literatura médica.
Foi citada brevemente por Smellie em 1764. Em 1872, Duchenne de Boulogne, em seu “Traitéde
l'Électrisation Localisée”, empregou o termo paralisia de origem obstétrica e descreveu
a paralisia das raízes superiores. Erb, em 1874, detalhou o quadro clínico da PO do
tronco superior (C5 e C6). Em 1885, Klumpke descreveu a paralisia mais rara das raízes
inferiores (C8 e T1), a qual pode estar associada à síndrome de Claude Bernard-Horner.
A incidência de PO varia entre 0,1 e 0,4% de todos os nascidos vivos. Apesar dos avanços
no cuidado obstétrico, a incidência de PO pode estar aumentando devido ao maior número
de recém-nascidos de alto peso. Vários fatores de risco foram identificados, entre
eles trabalho de parto prolongado, recém-nascido de alto peso, parto laborioso, uso
de fórceps e partos prévios que cursaram com PO. A DO é o fator mecânico que resulta
na lesão do tronco superior.[11] Fatores de risco significantes são: peso do recém-nascido > 4.000 g, DO e apresentações
pélvicas.[12]
O tipo mais comum de PO, e que apresenta melhor prognóstico, é a paralisia denominada
alta ou de Erb-Duchenne (90% dos casos), em que as raízes de C5-C6 são acometidas
e os músculos mais frequentemente envolvidos são o supra- e infraespinhal ([Figura 2]). Há ainda a paralisia total (mista), que apresenta paralisia tanto motora quanto
sensitiva de toda a extremidade do membro afetado devido a lesão de todas as raízes
do plexo; e a paralisia baixa ou de Klumpke (C8-T1), na qual os músculos do antebraço
e mão são os mais acometidos. A gravidade da lesão depende das raízes afetadas e de
sua extensão.
Fig. 2 Paralisia obstétrica de Erb.
Galbiatti et al[6] apresentam a anatomia clássica do plexo braquial e explicam que as lesões neurais
podem ser classificadas em três graus funcionais, segundo Seddon[13]:
Neuropraxia: sem alteração morfológica neural, definida como bloqueio localizado de
condução por alteração metabólica e representada clinicamente por paralisia motora,
discreta alteração sensitiva e simpática, apresentando recuperação total ao longo
de algumas semanas.
Axonotmese: interrupção axonal, sem lesão do endoneuro, levando a degeneração waleriana
distal à lesão. Ocorre regeneração axonal variável orientada pela preservação do endoneuro;
o tempo de recuperação depende, acima de tudo, da distância da lesão aos efetores
(basicamente à placa motora muscular).
Neurotmese: determina uma lesão total do nervo com destruição das estruturas internas
e externas. Não ocorre regeneração espontânea, sendo necessário o tratamento cirúrgico.
Na prática clínica, é frequente a dificuldade de classificação das lesões, principalmente
da axonotmese. Deve-se considerar, ainda, em relação às lesões do plexo braquial,
as avulsões ao nível da medula espinhal, também chamadas de lesões pré-ganglionares,
por se encontrarem proximais aos gânglios dos neurônios motores, que não permitem
reparação. Nessa situação, também ocorre lesão do ramo posterior da raiz nervosa e
leva à denervação da musculatura paravertebral da região cervical.
Os autores ressaltam a importância dos diagnósticos diferenciais mais frequentes,
que são a paralisia cerebral, as fraturas da clavícula e da diáfise do úmero, presentes
em entre 10 e 15% dos casos em apresentação cefálica.[6] O descolamento epifisário proximal do úmero, a osteomielite neonatal, a artrite
piógena do ombro e a sífilis congênita também são diagnósticos diferenciais.
A PO é uma das complicações associadas ao parto que necessita ser mais bem estudada
e compreendida, pois mantém sua incidência internacional até os dias atuais,[14] ocorrendo em todo o mundo, não distinguindo países ricos ou pobres, cirurgiões obstetras
jovens ou com vasta experiência, de enfermeiras obstétricas ou parteiras.
Nessa conjuntura, vêm aumentado as demandas médico-legais relacionadas a eventos desfavoráveis
relacionados ao parto, entre eles a PO. Neste escopo, principalmente os obstetras
são responsabilizados ou culpados por esses eventos ocorridos durante sua atividade
profissional. Configura-se em um clássico paradigma que, na última década, com a evolução
da medicina baseada em evidência (MBE), está sendo quebrado. Há atualmente novos estudos
comprovando novas etiologias como origem congênita, intrauterina, e causadas pelas
forças endógenas do parto, dentre outras. Já em 1997, Paradiso et al[15] publicam importante artigo que trata do exame de eletroneuromiografia (ENMG) ao
nascimento, demonstrando que a lesão do plexo braquial poderia ter ocorrido intraútero.
Os autores apresentam relato sobre uma criança de 18 dias com lesão de C5-C6 cujo
exame de ENMG era compatível com uma lesão antiga, datada de antes do nascimento.
Há casos em que certas crianças nascem com paralisia sem anormalidade no parto, sem
distócia e sem nenhuma manobra particular.
A definição clássica traz sinais de que a causa seria dos partos distócicos ou das
manobras do parto executadas pelo médico assistente. O presente trabalho tem por objetivo
colher dados da literatura de revisão, artigos clássicos, sentinelas e da MBE para
que os profissionais envolvidos com essa entidade, dentre eles o perito médico, tenham
subsídios científicos suficientes para compreender melhor os eventos ocorridos durante
o parto e identificar realmente de quem é a responsabilidade da PO.
Vamos, com esta revisão, à luz dos mais recentes estudos, mudar a direção, pelo menos
parcialmente, das causas da PO.
Métodos
Foi realizada uma pesquisa bibliográfica no motor de busca da PubMed (Medical Subject
Headings [MeSH, na sigla em inglês]) com as seguintes palavras-chave: shoulder dystocia and obstetric palsy, completamente aberto, sem limites de língua ou data. Encontramos 87 artigos. Posteriormente,
definimos como critério de inclusão artigos de revisão, dos quais restaram 22 artigos
de revisão com associação aos temas descritos até 8 de março de 2018. Excluímos 1
artigo, por se tratar de um mesmo estudo publicado em periódico diferente sob a forma
de versão compacta, restando, portanto, 21 artigos.
Foram atribuídos a esses 21 artigos números de ordem conforme a cronologia crescente
da publicação. Os artigos foram caracterizados quanto aos principais pontos relevantes,
com os seguintes descritores: distocia de ombros, parto cesáreo, prevenção, histórico, etiopatogenia e médico-legal. Quando incluímos no motor de busca descritores relacionados especificamente a perícia
médica, por exemplo, os descritores expert ou expert testimony, além de número limitado de artigos, estes entravam em temas não incluídos em nossa
proposta científica.
Realizamos uma revisão manual da bibliografia dos 21 artigos que originaram nossa
revisão e adicionamos à nossa bibliografia os artigos que foram citados na maioria
das publicações e também os artigos considerados clássicos ou sentinela (nestes não
foram considerados o ano de publicação ou a língua). Com esse conceito, foram valorizados
os artigos com cunho médico-legal.
Resultados
Foram incluídos 87 artigos com base nos critérios de inclusão referidos anteriormente,
excluindo-se 66 que não tinham características de revisão ou eram publicações repetidas
dos mesmos autores em outro periódico em versão compacta. Efetivamente, foram utilizados
como base 21 artigos, 17 de língua inglesa, 2 de língua francesa e 2 de língua alemã.
Os resultados encontrados mostram que não há artigos com níveis de evidência adequados,
sendo sua maioria de revisão da literatura.
No tocante ao ano da publicação, houve distribuição variável de 2000 a 2016 ([Tabela 1]).[14]
[16]
[17]
[18]
[19]
[20]
[21]
[22]
[23]
[24]
[25]
[26]
[27]
[28]
[29]
[30]
[31]
[32]
[33]
[34]
Tabela 1
|
Ordem
|
Autoria
|
Periódico
|
Ano
|
País
|
Língua
|
|
1
|
Beller[14]
|
Z Geburtshilfe Neonatol
|
2000
|
Alemanha
|
Alemão
|
|
2
|
Sandmire et al[35]
|
Birth
|
2002
|
EUA
|
Inglês
|
|
3
|
Sandmire et al[16]
|
Int J Gynaecol Obstet
|
2002
|
EUA
|
Inglês
|
|
4
|
Krause et al[17]
|
Z Geburtshilfe Neonatol
|
2005
|
Alemanha
|
Alemão
|
|
5
|
Gherman et al[18]
|
Am J Obstet Gynecol
|
2006
|
EUA
|
Inglês
|
|
6
|
Hankins et al[19]
|
Semin Perinatol
|
2006
|
EUA
|
Inglês
|
|
7
|
Gurewitsch[20]
|
Clin Obstet Gynecol
|
2007
|
EUA
|
Inglês
|
|
8
|
Allen[21]
|
Clin Obstet Gynecol
|
2007
|
EUA
|
Inglês
|
|
9
|
Jevitt et al[22]
|
J Perinat Neonatal Nurs
|
2008
|
EUA
|
Inglês
|
|
10
|
Doumouchtsis et al[23]
|
Obstet Gynecol Surv
|
2009
|
Inglaterra
|
Inglês
|
|
11
|
O'Shea et al[24]
|
Semin Perinatol
|
2010
|
EUA
|
Inglês
|
|
12
|
Doumouchtsis et al[25]
|
Ann N Y Acad Sci.
|
2010
|
Inglaterra
|
Inglês
|
|
13
|
Anderson[26]
|
Prim Care Clin Office Pract
|
2012
|
EUA
|
Inglês
|
|
14
|
Abzug et al[27]
|
Orthop Clin North Am
|
2014
|
EUA
|
Inglês
|
|
15
|
Stitely et al[28]
|
Seminars in Perinatology
|
2014
|
Nova Zelândia/EUA
|
Inglês
|
|
16
|
Chauhan et al[29]
|
Seminars in Perinatology
|
2014
|
EUA
|
Inglês
|
|
17
|
Ouzounian[30]
|
Seminars in Perinatology
|
2014
|
EUA
|
Inglês
|
|
18
|
Legendre et al[31]
|
J Gynecol Obstet Biol Reprod
|
2015
|
França
|
Fancês
|
|
19
|
Schmitz[32]
|
J Gynecol Obstet Biol Reprod
|
2015
|
França
|
Francês
|
|
20
|
Hill et al[33]
|
Womens Health
|
2016
|
EUA
|
Inglês
|
|
21
|
Sentilhes et al[34]
|
Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol
|
2016
|
França
|
Inglês
|
Todos os estudos principais foram de revisão de literatura, pois esta é uma das premissas
do método, e o número de artigos da bibliografia dos mesmos variou entre 11 a 121
artigos revisados.
Na [Tabela 2], encontram-se os dados referentes ao número de ordem, tipo de estudo, número de
bibliografias utilizadas por cada artigo, pontos mais relevantes e conclusões do estudo.
Tabela 2
|
Ordem
|
Tipo de Estudo
|
N° de Bibliografias
|
Pontos Relevantes
|
Conclusões
|
|
1
|
Revisão
|
86
|
Médico-legal
|
O grande número de POs sem distócia não permite afirmar que a PO é causada pelo obstetra.
|
|
2
|
Revisão
|
22
|
Histórico
|
PO ocorre em partos sem distócia[36]; a experiência do cirurgião indifere na incidência de PO[37]; evidência indireta estabelece que as forças propulsoras maternas como a causa mais
provável da paralisia de Erb.
|
|
3
|
Revisão
|
17
|
Distócia de Ombros
|
A causa mais provável de paralisia com e sem DO é o esforço materno devido às forças
expulsivas no parto
|
|
4
|
Revisão
|
86
|
Médico-legal
|
A causa-efeito clara entre DO e lesões do plexo braquial não existe em todos os casos,
embora a DO esteja geralmente associada a pareceres médico-legais obstétricos.
|
|
5
|
Revisão
|
121
|
Distócia de Ombros
|
Há risco significativamente aumentado de distócia de ombros com o peso ao nascer e
este aumenta linearmente; o pré-natal e o pré-parto não apresentam fatores de risco
estatisticamente significativos para a previsão de DO; parto cesáreo profilático ou
a indução medicamentosa do trabalho de parto em pacientes não diabéticas devido a
suspeita de macrossomia fetal não tem mostrado alterar a incidência de DO.
|
|
6
|
Revisão
|
43
|
Parto Cesáreo
|
Cesariana realizada em todas as mulheres com 39 semanas de gestação reduziria substancialmente
a ocorrência tanto transitória como permanente de lesão do plexo braquial, encefalopatia
neonatal, morte intraparto e intrauterina.
|
|
7
|
Revisão
|
74
|
Prevenção
|
A manipulação fetal parece ser o melhor método para a resolução atraumática do parto
vaginal complicado, pois requer menos tração para concluí-lo.
|
|
8
|
Revisão
|
69
|
Etiopatogenia
|
Os médicos precisam ser treinados para abrandar e calibrar a tração, pois a tendência
natural é aumentá-la quando se deparam com parto difícil. A tração axial deve ser
utilizada mas deve-se limitar a flexão lateral da cabeça.
|
|
9
|
Revisão
|
27
|
Prevenção
|
DO não é previsível; enfermeiros perinatais são úteis no pré-natal para evitar ganho
de peso excessivo e auxiliar no controle glicêmico e durante o parto na função de
cronometrista uma vez diagnosticada a DO.
|
|
10
|
Revisão
|
99
|
Etiopatogenia
|
A maioria das crianças com lesões do plexo braquial não apresentam fatores de risco
conhecidos; forças endógenas são de 4 a 9 vezes maiores que aquelas aplicadas pelo
obstetra durante a DO, segundo modelos matemáticos.
|
|
11
|
Revisão
|
95
|
Distócia de Ombros
|
Gestantes com cesariana prévia, qual melhor opção de parto? Não há estudos randomizados
disponíveis que se relacionem diretamente com a escolha do método de parto.
|
|
12
|
Revisão
|
51
|
Prevenção
|
DO é fator de risco para lesão do plexo braquial (aumenta em 100x risco de PO), mas
é imprevisível; proporção significativa de lesão de plexo é secundária a ferimentos
no útero.
|
|
13
|
Revisão
|
44
|
Distócia de Ombros
|
FR materno, fetal e do parto têm baixo valor preditivo; distócia de ombros ocorre
mais comumente em pacientes sem FR identificados.
|
|
14
|
Revisão
|
46
|
Distócia de Ombros
|
A paralisia de parto do plexo braquial pode resultar em déficits permanentes ao longo
da vida e continua a ser comum apesar dos avanços em cuidados obstétricos. Os resultados
a longo prazo das recomendações atuais sobre o tratamento permanecem desconhecidos.
|
|
15
|
Revisão
|
28
|
Distócia de Ombros
|
Algumas manobras e algoritmos podem ser utilizados no gerenciamento das distócias
de ombro. A partir de estudos entre mulheres cujo parto é complicado pela distócia
do ombro, há evidências científicas consideráveis de que a manobra de todos os tempos
é efetiva para a liberação dos ombros fetais.
|
|
16
|
Revisão
|
80
|
Distócia de Ombros
|
O conhecimento epidemiológico da incidência, prevalência e alterações temporais da
NBPP deve auxiliar o clínico, evitar intervenções desnecessárias e ajudar a formular
políticas de saúde baseadas em evidências. A natureza extremamente infreqüente da
NBPP permanente requer um estudo multicêntrico para melhorar nossa compreensão dos
fatores antecedentes e reduzir a sequela de longo prazo.
|
|
17
|
Revisão
|
26
|
Distócia de Ombros
|
Os fatores de risco históricos para a ocorrência de NBPP, sejam eles estudados sozinhos
ou em combinação, não foram mostrados como preditores confiáveis. A maioria dos casos
de NBPP ocorre em mulheres com crianças < 4,500 g que não são diabéticas e não têm
outros fatores de risco identificáveis. Além disso, a cesariana reduz, mas não elimina
completamente o risco de NBPP.
|
|
18
|
Revisão
|
23
|
Distócia de Ombros
|
Quanto à prevenção de complicações da distócia do ombro, o treinamento prático usando
manequins está associado a melhorias na administração de distócia do ombro do que
ao treinamento usando o tutorial em vídeo. O ensino de simulação para o tratamento
da distócia do ombro é encorajado para o treinamento inicial e contínuo dos vários
atores na sala de nascimento (acordo profissional).
|
|
19
|
Revisão
|
55
|
Prevenção
|
Para evitar a distócia do ombro e suas complicações, duas medidas são propostas. A
indução do trabalho de parto é recomendada em caso de macrossomia iminente se o colo
do útero for favorável e idade gestacional > 39 semanas (Consenso profissional). A
administração de cesárea é recomendada antes do trabalho de parto no caso de (I) feto > 4,500
g se associado a diabetes materna, (II) feto > 5000 g na ausência de diabetes materno
e, (III) durante o trabalho de parto, em caso de macrossomia fetal e falha no progresso
no segundo estágio, quando a cabeça fetal está acima de uma posição +2. A cesariana
deve ser discutida quando o histórico da distócia do ombro tem sido associado a complicações
neonatais ou maternas graves (consenso profissional).
|
|
20
|
Revisão
|
94
|
Distócia de Ombros
|
A distócia do ombro pode ser prevenida através da realização de cesariana preventiva
em casos de risco muito alto, mas a nossa capacidade de identificar esses casos ainda
é limitada. O diagnóstico rápido e o manejo da distócia do ombro quando ocorre é a
chave para prevenir seqüelas neurológicas permanentes. O gerenciamento requer os esforços
coordenados de uma equipe com as habilidades necessárias. O líder da equipe deve direcionar
o gerenciamento e instituir uma série de manobras para libertar o feto com risco mínimo
para ele e para a mãe. É necessária uma compreensão completa da anatomia pélvica e
fetal relevante, bem como dos mecanismos através dos quais a distócia pode ser resolvida.
|
|
21
|
Revisão
|
11
|
Distócia de Ombros
|
Nenhum estudo provou que a correção dos fatores de risco (exceto diabetes gestacional)
reduziria o risco de DO. A atividade física é recomendada antes e durante a gravidez
para reduzir a ocorrência de alguns fatores de risco. A implementação de treinamento
prático com simulação para todos os prestadores de cuidados na sala de parto está
associada a uma redução significativa na lesão neonatal, mas não maternal. A DO continua
a ser uma emergência obstétrica imprevisível. Todos os médicos e parteiras devem conhecer
e executar manobras obstétricas, se necessário, rapidamente, mas com calma.
|
Discussão
A PO é classicamente definida como paralisia flácida parcial ou total que acomete
o membro superior decorrente da lesão do plexo braquial ocorrida no parto. Esse conceito
está presente tanto nos livros-texto ortopédicos quanto obstétricos[2]
[6], porém a literatura das últimas 2 décadas tem mostrado que mais da metade dos casos
não estão associados à DO.[14]
[23]
[35] Outras etiologias têm sido consideradas, como origem congênita, intrauterina, e
as causadas pelas forças endógenas do parto, dentre outras.
Atualmente, temos várias evidências de que muitos outros fatores podem estar envolvidos
na causa da PO, sem nenhuma relação com as manobras de parto executadas pelos obstetras.
Zaki et al,[36] em estudo sobre lesão familiar congênita de paralisia do plexo braquial, apresentam
um relatório de dois níveis sobre famílias egípcias afetadas ao nascimento, caracterizada
como relativamente incomum e quase um transtorno esporádico. Mollica et al[37] descrevem uma família siciliana que apresenta lesão congênita do plexo braquial
severa e sugerem que o gene tem herança autossômica dominante com penetrância reduzida.
Os autores relatam que herança ligada ao X com expressão em mulheres heterozigóticas
não pode ser descartada.
As malformações uterinas e as forças propulsivas na segunda fase do parto constituem
os principais fatores etiológicos para as lesões do plexo,[16]
[18]
[25]
[35]
[38]
[39] principalmente nos casos sem DO.
Entre as causas uterinas, podemos destacar as malformações uterinas tais como miomas,
septo intrauterino ou útero bicorno.[25] A mal adaptação intrauterina (por exemplo, oligodrâmnio) pode estar relacionada
à diminuição da resistência dos feixes nervosos do plexo braquial ou estruturas da
cintura escapular, levando à lesão do plexo.[40]
Em relação ao parto vaginal, podemos dividi-lo didaticamente em três fases: a primeira
delas é a dilatação e corresponde ao abaixamento do feto no eixo de encaixe na pelve
óssea. A segunda fase é a de expulsão, que dura entre 30 minutos e 2 horas.
A segunda fase se subdivide em duas etapas: a primeira é a conclusão da descida e
rotação da apresentação, e a segunda é a descida propriamente dita, na qual a pressão
abdominal deve ser controlada e dirigida com as contrações uterinas para que haja
a expulsão do feto.[2] Na segunda etapa é que pode ocorrer a DO e as lesões do plexo devido à compressão
do ombro posterior contra o promontório sacral durante as contrações uterinas. Segundo
modelos matemáticos, as forças expulsivas são quatro a nove vezes maiores que a tração
exercida pelo obstetra.[25]
[35]
A terceira e última fase do parto começa ao nascimento e termina quando a placenta
dequita.
Devido a esses novos conhecimentos, Gherman et al,
[39] já em 1998, em sua revisão, afirmavam que evidências indiretas estabeleciam as forças
propulsoras maternas como a causa mais provável da paralisia de Erb, tanto nos casos
com DO associada quanto nos casos sem esta, pois as técnicas de manipulação fetal
direta para a resolução da DO não se associavam a maiores taxas de lesão do plexo,
fraturas de úmero ou clavícula. Sandmire et al,[16] em 2002, Gherman et al,[18] em 2006, Doumouchtsis et al,[25] em 2010, e Abzug et al,[27] em 2014, respectivamente, evidenciaram esses conhecimentos em suas revisões, dando
informações suficientes para concluir-se que a recente ênfase dada à MBE abalou muitos
dos mitos e equívocos em torno da DO. Portanto, o peso imputado ao médico assistente
no parto devido a uma lesão do plexo braquial necessita ser revisto.
Os principais fatores de risco para lesão do plexo braquial são: macrossomia fetal
(peso fetal > 4.000 g), apresentação pélvica e DO.[2]
[6]
[11]
[12]
[19]
[21]
[26]
[35] A obesidade materna, diabetes materno ou gestacional, aumento excessivo de peso
durante a gravidez, sexo masculino do feto, prematuridade, história pregressa de macrossomia
fetal, partos distócicos anteriores, multiparidade, instrumentação com fórceps, idade
materna avançada e nascimento pós-termo são considerados fatores de risco secundários.[18]
[21]
[39]
[40] Ouzounian[30] defende que a cesariana reduz, mas não elimina completamente o risco de lesão do
plexo braquial.
Apesar das múltiplas análises de fatores de risco na literatura, DO não pode ser prevista
ou evitada, pois os métodos precisos para identificar quais os fetos que irão experimentar
essa complicação não existem. Os dados encontrados no pré-natal e pré-parto têm baixo
valor preditivo.[18]
[22]
[24]
[26] O exame ultrassonográfico realizado tardiamente na gestação também apresenta baixa
sensibilidade, com pouca precisão sobre a estimativa do peso ao nascimento – há uma
tendência geral a superestimá-lo. Devemos salientar ainda que a DO ocorre mais comumente
em pacientes sem fatores de risco.[26]
Como o risco de DO é diretamente proporcional ao aumento do peso do feto,[39] tem-se proposto a cesariana profilática em casos selecionados.[32]
[33] Segundo a Sociedade Americana de Ginecologia e Obstetrícia (ACOG, na sigla em inglês)
e Schmitz,[32] devemos considerá-la em fetos de mães diabéticas com estimativa de peso > 4.500 g
ou fetos de mães sem fatores de risco com > 5.000 g. Outros autores, como Hankins
et al[19] recomendam em fetos de mães diabéticas com estimativas de peso entre 4.000 e 4.250 g
ou > 4.000 g nas gestações de mulheres não diabéticas.
Uma melhor compreensão das causas da PO se faz necessária, uma vez que as demandas
médico-legais têm aumentado em todo o mundo, e, na maioria das vezes em que há perda
permanente da função do membro superior, o médico assistente é obrigado a indenizar
a família da criança por imperícia. Segundo a Associação de Seguros Médicos da América,
de janeiro de 1985 a dezembro de 2001, o valor médio pago por indenizações relacionadas
à lesão do plexo braquial foi de US$301.000,00 (aproximadamente quatro vezes mais
que o valor médio pago devido à imperícia por outras causas no período), num valor
total de US$54 milhões. Os valores indenizatórios foram maiores para médicos assistentes
de instituições de ensino.[38]
Para evitar essas situações litigiosas, Noble[41] orienta realizar registros precisos e detalhados para que haja uma defesa bem-sucedida.
Porém, o fundamental continua sendo a relação médico-paciente. Hickson et al[42] demonstraram em seu estudo que 70% das mães que processaram os obstetras devido
a lesões perinatais em seus recém-nascidos queixaram-se que esses profissionais não
as informaram adequadamente acerca das possíveis lesões permanentes no desenvolvimento
neuropsicomotor de seus filhos. Informar os riscos inerentes ao parto, como o fato
de que lesões do plexo braquial não são necessariamente decorrentes de tocotraumatismo,
e tentar entender os medos e anseios da paciente são essenciais para minimizar as
questões médico-legais.[36]
A capacitação da equipe cirúrgica quanto à compreensão completa da anatomia pélvica
e fetal, bem como dos mecanismos, algoritmos e manobras através dos quais a distócia
pode ser resolvida, o conhecimento epidemiológico da incidência, prevalência e alterações
temporais da paralisia do plexo braquial neonatal, são de fundamental importância
para o bom gerenciamento de um centro obstétrico.[19]
[29]
[32]
[33]
[34] Legendre et al,[31] defendem em seu estudo o treinamento prático inicial e contínuo dos vários atores
na sala de nascimento usando manequins, que segundo os autores está associado a melhorias
na administração de distócia do ombro do que ao treinamento usando o tutorial em vídeo.
Considerações finais
Acreditamos que com a presente revisão da literatura podemos sem sombra de dúvidas
auxiliar a quebrar o paradigma estabelecido desde a antiguidade de que essa lesão
seria causada única e exclusivamente por imperícia médica. A literatura está mudando
sua direção, demonstrando que há outras múltiplas causas ou co-causas para a ocorrência
de paralisia obstétrica, em algumas delas sem nenhum envolvimento da equipe médica.
Portanto, sobre de quem é a responsabilidade da PO, no momento há evidências indiretas
que estabelecem que as forças propulsoras maternas (endógenas) podem ser a causa mais
provável da paralisia do plexo braquial no nascimento, nos partos sem DO e crianças
com peso < 4.000g. A PO pode ter origem intraútero, genética, ou postural, sendo importante
para a proteção médico-legal a complementação de relatórios do prontuário médico,
como também a realização de exame de ENMG até 21 dias após o nascimento para definir
se esta ocorreu intraútero ou no nascimento. Há ainda a necessidade de novas publicações
bem embasadas e prospectivas com MBE para melhor definir qual o real ou os reais responsáveis
pela ocorrência de PO.