Palavras-chave
fraturas de tornozelo - fixação interna de fraturas - fraturas ósseas - fíbula - placas
ósseas
Introdução
A fratura de tornozelo é uma das lesões mais comuns, principalmente por causa do aumento
da incidência de osteoporose e da maior atividade da população idosa.[1]
[2]
[3] O espectro varia de uma fratura lateral isolada e relativamente estável do maléolo
a luxações instáveis da fratura bimaleolar/trimaleolar. As fraturas da porção distal
da fíbula, embora possam parecer relativamente inócuas, exigem exame clínico e radiológico
completo (teste de esforço com rotação externa) para que a instabilidade medial do
tornozelo não seja negligenciada.[4]
[5]
[6]
[7] A importância do maléolo lateral na estabilização das lesões no tornozelo foi destacada
há quase 40 anos por Yablon et al.[8]
Estudos mostraram o aumento da incidência de lesões altamente instáveis em abdução
e pronação.[9] A redução anatômica e a estabilização cirúrgica melhoraram os desfechos nas fraturas
da fíbula distal com luxação, minimizando o risco de desenvolvimento de artrite pós-traumática.[10]
[11]
[12]
[13] Tradicionalmente, essas fraturas são fixadas com um parafuso interfragmentar e uma
placa de neutralização lateral ou posterior com princípio de antideslizamento; há
uma crescente tendência de uso de placas bloqueadas e das novas placas anatômicas
com pré-contorno, especialmente em fraturas osteoporóticas, que oferecem maior resistência
à força de deslocamento e maior número de parafusos no segmento distal.[10]
[14]
[15] Até o momento, ainda não há consenso sobre o método ideal de fixação.
Utilizamos uma placa bloqueada de compressão (LCP) de 3,5 mm retorcida e com contorno
(Synthes, Westchester, PA, EUA) como placa de apoio posterior para o tratamento de
fraturas da fíbula distal. Teoricamente, essa placa combina a força de uma LCP com
a vantagem biomecânica do revestimento antideslizante posterior. Este artigo analisa
os resultados desse método de fixação.
Materiais e Métodos
Analisamos retrospectivamente nossos dados coletados entre 1° de janeiro de 2012 e
31 de dezembro de 2015 de pacientes com fratura fibular distal dos tipos Danis-Weber
B e C submetida à fixação com LCP retorcida de 3,5 mm, com ou sem fixação/reparo do
maléolo medial/ligamento deltoide e/ou do maléolo posterior e/ou fixação sindesmótica
e/ou da tíbia distal por um único cirurgião. Incluímos apenas os pacientes com período
mínimo de acompanhamento de 12 meses. Casos com fratura de Danis-Weber tipo A, lesões
abertas e fraturas pediátricas (pacientes com fise aberta) foram excluídos. Um total
de 41 das 62 fraturas de tornozelo tratadas em nosso instituto pelo autor sênior atenderam
aos critérios de inclusão. Os padrões demográficos e de fratura dos pacientes foram
descritos na [Tabela 1].
Tabela 1
|
Gênero
|
Masculino: 17; Feminino: 24
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Idade Média (anos) (faixa)
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48 (26–76)
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Lado
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Direito - 20, Esquerdo - 21
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Fratura isolada do maléolo lateral
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11
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Fratura bimaleolar
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18
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Fratura trimaleolar
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11
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Fratura do encaixe da tíbia distal com o maléolo lateral
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1
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|
Danis-Weber Tipo B
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32
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Danis-Weber Tipo C
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9
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Lesão associada do ligamento deltoide
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6
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Lesão sindesmótica associada
|
4
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Técnica Cirúrgica
A cirurgia foi realizada com base no julgamento clínico do autor sênior, após análise
do edema e dos tecidos moles. Uma incisão cutânea longitudinal de 5 a 7 cm foi realizada
no aspecto posterolateral da fíbula distal e aprofundada até o periósteo para obtenção
de retalhos cutâneos espessos ([Fig. 1]) depois do acionamento do torniquete. O local da fratura foi exposto por dissecção
subperióstea aguda, sem exposição dos tendões fibulares ou das bainhas tendíneas.
Após a redução anatômica, um modelo metálico foi retorcido para corresponder ao contorno
da anatomia fibular distal, onde a superfície lateral forma uma espiral posterolateral
no quarto inferior para se tornar contínua ao sulco posterior do maléolo lateral[16] ([Figs. 2] e [3]). A LCP de 3,5 mm (Synthes, Westchester, PA, EUA) de comprimento adequado foi retorcida
com a placa de ferro adequada (Synthes, Westchester, PA, Estados Unidos) para corresponder
ao modelo; a parte distal da placa foi retorcida em direção posterolateral ([Fig. 4]). Isso assegurou que a LCP fosse mantida ao longo da superfície lateral proximalmente
e na superfície posterior do maléolo lateral distalmente com braçadeiras de fixação,
correspondendo à anatomia fibular distal ([Fig. 5]). A placa foi usada como apoio posterior, primeiramente com encaixe do orifício
mais próximo ao local da fratura no fragmento proximal e encostando a placa no maléolo
lateral. A seguir, o fragmento distal foi fixado com parafusos bicorticais em direção
de posterior a anterior; os parafusos bicorticais foram, então, colocados em sentido
lateral a medial no fragmento proximal. A sindesmose foi fixada com um parafuso tricortical
de 3,5 mm através da placa, no local indicado. Após a fixação, confirmamos que os
tendões peroneais e as bainhas não estavam em contato direto com o material protético.
A redução da fratura, a posição do parafuso e os comprimentos foram verificados durante
a cirurgia com um intensificador de imagem. A fixação/reparo medial e/ou colocação
de placa na porção distal da tíbia foram realizados sempre que necessário. Após o
fechamento em camadas da ferida e a colocação do curativo, todos os pacientes usaram
uma tala gessada em U por 48 horas e, depois, um imobilizador por 4 a 6 semanas. A
amplitude de movimento ativa do tornozelo foi incentivada após a remoção da tala às
48 horas. Os pacientes usaram andador/muletas sem sustentação de peso. A sustentação
total do peso corporal foi permitida de acordo com a recuperação clínica e radiográfica.
Fig. 1 Incisão cutânea posterolateral.
Fig. 2 Natureza espinhal da fíbula distal.
Fig. 3 Modelo com contorno compatível com a anatomia da fíbula distal.
Fig. 4 Placa bloqueada de compressão (LCP) retorcida para ser compatível com o modelo.
Fig. 5 Placa bloqueada de compressão (LCP) retorcida aplicada após a redução da fratura.
Avaliação Clínica e Radiológica
Após a confirmação da cicatrização, os pacientes foram atendidos em 2 semanas, 6 semanas,
3 meses, 6 meses, 12 meses e uma vez ao ano para avaliação clínica e radiográfica.
Os dados clínicos e radiográficos foram revistos e os resultados funcionais foram
avaliados de acordo com a pontuação de retropé-tornozelo da American Orthopaedic Foot
and Ankle Society (AOFAS)[17]
[18] em cada estágio até a última consulta de acompanhamento. A cicatrização foi definida
pela presença de trabéculas ósseas que cruzam a fratura nas radiografias, acompanhada
por ausência de dor ou sensibilidade no local acometido. As complicações pós-operatórias
e o tempo até a consolidação união foram registrados. Houve suspeita de tendinopatia
peroneal na presença de dor e edema associados ao longo dos tendões fibulares, juntamente
com dor no aspecto lateral do tornozelo durante a excursão do tendão. A remoção do
implante foi realizada caso os pacientes se queixassem de desconforto relacionado
ao material protético, se existissem sinais sugestivos de tendinopatia peroneal ou
se o procedimento fosse solicitado, mesmo na ausência dessas alterações.
Resultados
O maléolo medial foi fixado com fios de banda de tensão em quatro casos, parafuso
esponjoso em 21 casos e LCP de 3,5 mm na tíbia medial distal. A fixação do maléolo
posterior foi realizada em dois casos com parafusos esponjosos. O ligamento deltoide
foi reconstruído em dois pacientes, enquanto três das quatro lesões sindesmóticas
foram fixadas com um parafuso sindesmótico.
O comprimento médio da LCP retorcida na fíbula distal foi de 7,9 furos (6 a 12). Todas
as 41 fraturas fibulares distais cicatrizaram sem intercorrências, em um período médio
de 10,4 semanas (com variação de 8 a 14 semanas) ([Figs. 6]
[7]
[8] a [9]). Não foram observadas complicações nos tecidos moles, necrose cutânea, infecção
superficial ou profunda ou lesão do nervo fibular superficial. Não houve casos com
complicações relacionadas ao material protético, impacto peroneal ou ausência de consolidação.
Um paciente insistiu na remoção da placa 20 meses após a primeira cirurgia, apesar
de não haver evidência de desconforto relacionado ao material protético ou impacto
peroneal. A pontuação AOFAS média foi de 92,6 (com variação de 86 a 100) em um período
médio de acompanhamento de 31,5 meses (com variação de 14 a 61 meses).
Fig. 6 Radiografia anteroposterior pré-operatória de tornozelo esquerdo com fratura de maléolo
lateral de Danis-Weber tipo B.
Fig. 7 Radiografia pré-operatória de tornozelo esquerdo com fratura de maléolo lateral de
Danis-Weber tipo B.
Fig. 8 Radiografia realizada aos 34 meses de acompanhamento mostra a consolidação da fratura.
Fig. 9 Radiografia realizada aos 34 meses de acompanhamento mostra a consolidação da fratura.
Discussão
O objetivo da fixação da fratura do tornozelo é a obtenção de redução anatômica estável,
o que assegura o bom resultado funcional, permite a reabilitação precoce e reduz as
sequelas de artrite pós-traumática em longo prazo. A literatura mostrou que as estratégias
de fixação intramedular ou extramedular são bem-sucedidas.[3]
[10]
[19]
[20]
[21]
[22]
[23]
Estudos demonstraram que a fixação antideslizante posterior fortalece a fixação das
placas bloqueadas laterais que, por sua vez, são mais resistentes do que as placas
laterais de neutralização sem bloqueio.[24]
[25]
[26]
[27]
[28] As placas bloqueadas são cada vez mais usadas para fixação de fraturas periarticulares
e metafisárias, inclusive fraturas do aspecto distal da fíbula.[14]
[26] A posição da placa antideslizante posterolateral permitiu o uso de parafusos bicorticais
mais longos através do fragmento distal, o que melhora a fixação.[28]
A superioridade biomecânica da placa antideslizante fibular posterior em comparação
à placa fibular lateral, bem como o efeito positivo do bloqueio em comparação às placas
convencionais nas fraturas do tornozelo, foram demonstrados por vários autores.[9]
[15]
[25]
[27]
[28] Switaj et al[14] demonstraram a superioridade biomecânica das placas fibulares distais com contorno
anatômico e maior número de parafusos no fragmento distal em comparação às placas
antideslizantes.
Esses estudos mostram que a colocação posterior de uma LCP poderia combinar as vantagens
de uma placa antideslizante e de uma LCP. A técnica do autor, de usar uma LCP retorcida
como apoio posterior, faz a fixação bicortical de posterior a anterior no fragmento
distal e fixação lateral a medial no fragmento proximal, combinando as vantagens da
placa antideslizante colocada em posição posterior e de uma LCP colocada em posição
lateral. Neste método, a LCP se ajusta à fíbula distal no ponto em que a superfície
lateral forma uma espiral posterolateral e se torna a superfície posterior do maléolo
lateral. A taxa de consolidação foi de 100%, com excelente pontuação AOFAS média em
todos os nossos casos.
A tendinopatia peroneal secundária à fixação posterior tem sido descrita com diferentes
incidências na literatura.[23]
[24]
[29] Não houve casos de tendinopatia peroneal em nossa série, possivelmente devido à
dissecção perióstea aguda, à medida precisa do comprimento do parafuso, e ao uso de
placas que não atravessaram o sulco peroneal ou atingiram a ponta distal.
O ponto fraco de nosso estudo é sua natureza retrospectiva, sem grupo controle. Todas
as variedades de lesões no tornozelo, como maléolo medial isolado, sindesmótico e
tibial distal, foram incluídas, reduzindo a força das impressões obtidas. O presente
estudo não é uma análise comparativa entre várias estratégias de fixação que nos permitiria
a conclusão estatística da superioridade de um método sobre os demais, caso existisse.
Além disso, uma análise biomecânica seria necessária para analisar a força desse construto
e compará-lo a outros modos de fixação.
Embora essa técnica tenha sido descrita na literatura, não há estudos clínicos em
longo prazo que analisem seus resultados. Este é o primeiro estudo clínico da literatura
destacando os resultados das placas retorcidas em fraturas do aspecto distal da fíbula.
Um acompanhamento clínico mais longo, superior a 10 anos, nos proporcionará uma melhor
análise dos resultados de nosso construto.
Conclusão
Numerosas estratégias de fixação foram descritas para o tratamento de fraturas da
fíbula distal, cada uma com seus próprios méritos e deméritos. Nosso estudo destaca
uma técnica que combina as vantagens da placa antideslizante posterior e da placa
bloqueada lateral com uso de uma LCP retorcida de 3,5 mm, com excelente resultado
clínico e radiológico.