CC BY-NC-ND 4.0 · Rev Bras Ortop (Sao Paulo) 2021; 56(06): 726-732
DOI: 10.1055/s-0041-1729583
Artigo Original
Ombro e Cotovelo

Avaliação clínica comparativa de duas técnicas no tratamento artroscópico das lesões parciais articulares do manguito rotador[*]

Article in several languages: português | English
1   Grupo de Cirurgia de Ombro e Cotovelo, Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
,
1   Grupo de Cirurgia de Ombro e Cotovelo, Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
,
Caio Santos Checchia
1   Grupo de Cirurgia de Ombro e Cotovelo, Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
,
Hector Carmona Marmille
1   Grupo de Cirurgia de Ombro e Cotovelo, Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
,
Cláudio Santili
2   Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
,
Alberto Naoki Miyazaki
1   Grupo de Cirurgia de Ombro e Cotovelo, Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
› Author Affiliations
Suporte Financeiro Não houve suporte financeiro de fontes públicas, comerciais, ou sem fins lucrativos.
 

Resumo

Objetivos Avaliar os resultados clínicos dos pacientes submetidos ao tratamento artroscópico da lesão parcial da porção articular do manguito rotador pelas técnicas de sutura transtendão e após completada a lesão e comparar o tempo de recuperação pós-operatório das duas técnicas.

Método Estudo retrospectivo baseado na identificação de todos os casos com lesão parcial da porção articular do manguito rotador submetidos a tratamento artroscópico no período de outubro de 1999 a dezembro de 2016 pelo Grupo de Ombro e Cotovelo da nossa instituição. Foram incluídos 39 pacientes divididos em 2 grupos: os que foram submetidos à técnica transtendínea e os outros em que a lesão foi completada. Os dois grupos foram estatisticamente semelhantes. Foi realizada a análise dos respectivos prontuários, da identificação da técnica aplicada, dos resultados pós-operatórios e das complicações relacionadas. A avaliação funcional foi realizada através do escore da University of California at Los Angeles (UCLA).

Resultados Não houve diferença estatisticamente relevante entre os grupos, com escore UCLA médio de 32, não havendo diferença também no tempo necessário para reabilitação.

Conclusão Não houve diferença entre o resultado clínico dos pacientes, independente da técnica empregada para o reparo das lesões parciais da porção articular do manguito rotador com resultados satisfatórios em 93% dos casos.


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Introdução

A lesão parcial do manguito rotador é reconhecida como uma importante causa de disfunção e dor no ombro.[1] Sua incidência ainda não é consenso na literatura, apesar de existirem diversos estudos sobre ela.[2] [3] [4] Sher et al.,[3] analisando 96 ombros assintomáticos através de ultrassonografia, encontraram 20% de lesões parciais. Ao dissecar 249 ombros de cadáveres, Lohr e Uhthoff[2] encontraram 32% de lesões parciais, enquanto Fukuda[5] encontrou 13%. Esses autores descreveram que cerca de 1/3 (27%) dessas lesões acometem a porção articular.

Ellman[6] foi o primeiro a propor, baseado em achados artroscópicos, um sistema de classificação da lesão parcial em relação a sua localização (A, articular; B, bursal; C, intratendínea) e a sua extensão (grau 1: ˂ 3 mm; grau 2: de 3–6 mm; grau 3: ˃ 6 mm).

Quanto à fisiopatologia das lesões parciais da porção articular (LPPAs) do manguito rotador, acredita-se que elas podem ocorrer tanto com mecanismos intrínsecos (área de hipovascularização e alterações metabólicas relativas à idade) quanto extrínsecos (impacto interno póstero-superior, eventos traumáticos agudos e microtraumas de repetição), ou até mesmo uma combinação entre eles.[7] Weinreb et al.,[8] em 2014, publicaram um artigo mostrando que existem evidências de que fatores intrínsecos relacionados ao tendão levam à degeneração de suas fibras na face articular com afilamento e desorientação dessas, resultando na lesão anatômica dessa região. Corroborando essas evidências, Ozaki et al.[9] não encontraram sinais de impacto subacromial nas lesões articulares do manguito rotador e, portanto, a excluem como possível causa para essas lesões. Outro mecanismo que leva à LPPA do manguito rotador é encontrado nos atletas arremessadores, que podem ter um impacto interno póstero-superior.[4] [10]

O tratamento inicial da LPPA do manguito rotador é realizado com medidas conservadoras, tais como fisioterapia e mudança dos hábitos para evitar a progressão da lesão.[11] O tratamento cirúrgico está indicado na falha do tratamento conservador e nos casos em que a lesão acomete mais de 50% da espessura do tendão, devido a um risco maior de progressão da lesão; 40% das LPPAs evoluem para lesões completas, de acordo com Mall et al.[12] e Stuart et al.[13]

Diferentes técnicas cirúrgicas artroscópicas têm sido descritas para abordagem desse tipo de lesão, desde um simples desbridamento artroscópico do tendão, acreditando na sua capacidade de cicatrização (desde que realizado em lesões de baixo grau[14]), à realização de um reparo transtendão da lesão, descrito inicialmente por Stephen Snyder,[15] ou ainda a desinserção da área de tendão acometido (“completando a lesão”) seguida do seu reparo.[16]

O objetivo principal deste trabalho é avaliar os resultados clínicos dos pacientes submetidos ao tratamento artroscópico das LPPAs pelas técnicas de sutura transtendínea e após completada a lesão e comparar o tempo de recuperação pós-operatório das duas técnicas.


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Casuísticas e métodos

No período de outubro de 1999 a dezembro de 2016, 39 pacientes com diagnóstico de LPPA foram submetidos a tratamento cirúrgico artroscópico realizado pelo Grupo de Ombro e Cotovelo do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da nossa instituição.

Os pacientes, todos com lesão parcial articular do tendão do músculo supra-espinal, foram divididos em dois grupos: grupo I, os que foram submetidos ao reparo transtendão, e o grupo II, pacientes submetidos ao tratamento com reparo após transformar a lesão parcial em completa.

Os critérios de inclusão foram: pacientes com diagnóstico de lesão parcial da porção articular do manguito rotador, realizado por meio de imagens de ressonância magnética do período pré-operatório, submetidos a tratamento artroscópico, e que tiveram seguimento mínimo ≥ 2 anos.

No grupo I, com 19 pacientes e média de seguimento de 4,61 anos, 13 eram do sexo masculino (68%) e 6 do sexo feminino. A média de idade foi de 48 anos, com variação de 34 a 70 anos. O lado dominante foi acometido em 73% dos casos; 16 pacientes (84%) praticavam esporte e 9 pacientes (47%) relataram evento traumático como desencadeante do quadro.

No grupo II, com 20 pacientes e média de seguimento de 4,35 anos, 11 eram do sexo masculino (55%) e 9 do sexo feminino. A média de idade foi de 52 anos, com variação de 29 a 75 anos. O lado dominante foi acometido em 85% dos casos, 11 pacientes (55%) praticavam esporte e apenas 3 pacientes relataram evento traumático.

Não houve diferenças estatisticamente significantes entre as amostras em relação a idade, sexo e membro acometido, sendo que em 78% dos casos o lado dominante foi afetado. Todos os pacientes foram submetidos ao procedimento cirúrgico em posição de cadeira de praia, sob anestesia geral associada a bloqueio anestésico do plexo braquial. Foi realizada inspeção artroscópica articular, seguida de inspeção subacromial e bursectomia parcial. No grupo I, sete pacientes apresentavam lesão do tipo SLAP, dois com artrose da articulação acromioclavicular, um com fratura do tubérculo maior, já consolidada e que foi tratada conservadoramente, um paciente com lesão do cabeça longa do bíceps e um paciente com lesão de Bankart. Já no grupo II, seis pacientes apresentavam lesão do tipo superior labral anterior posterior (SLAP), quatro com ruptura do cabeça longa do bíceps e três com artrose da articulação acromioclavicular. A partir desse ponto, as técnicas se diferenciam: nos pacientes do grupo I foi realizada a passagem dos fios das âncoras via transtendão, através do espaço articular para a superfície bursal, seguindo com o reparo. Quando optamos por esse tipo de reparo, aumentamos a pressão da bomba de infusão de soro para perto de 80 mmHg, o que faz com que o espaço articular aumente e o tendão levante do seu leito de inserção e possibilite a visualização intra-articular da passagem das âncoras de subacromial para intra-articular e seu correto posicionamento no chamado footprint. Depois de fixada a âncora, um fio é pego com uma pinça tipo birdbick e passado através do tendão num ponto de tecido considerado sadio, isto é, fora da área da lesão. Retornamos a pressão da bomba para o valor normal, para evitar um edema exagerado e rápido que impeça o restante da cirurgia. Depois, a ótica é posicionada novamente no espaço subacromial e os fios são amarrados com pontos simples de correr. O procedimento é repetido quantas vezes se achar necessário ([Figura 1]). Já nos pacientes do grupo II, foi realizada a desinserção das fibras bursais que se mantinham intactas, transformando-a em uma lesão completa, sendo seguido do reparo por meio da passagem dos fios de sutura pela face bursal ([Figura 2]). Todas as lesões foram reparadas pela técnica de pontos simples via artroscópica.

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Fig. 1 Reparo transtendão da lesão parcial articular do tendão do músculo supraespinal. A - Representação da lesão parcial articular, B - Forma de passagem dos fios de sutura de acordo com esta técnica, C - Lesão suturada.
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Fig. 2 Reparo após transformar a lesão parcial em completa na lesão parcial articular do tendão do músculo supraespinal. A - Representação da lesão parcial articular, B - Lesão parcial sendo completada, C - Forma de passagem dos fios de sutura na lesão já completada, D - Lesão suturada.

No período pós-operatório, os pacientes ficaram imobilizados com tipoia funcional entre 4 e 6 semanas, dando sequência à reabilitação.

Foi avaliada a amplitude do arco de movimento aferindo-se a elevação, rotações lateral e medial. A avaliação clínica foi realizada por meio do escore da University of California at Los Angeles (UCLA).[17] Para a avaliação do tempo de recuperação, utilizamos a comparação do tempo que os pacientes dos dois grupos demoraram para atingir o seu valor “máximo” do escore do UCLA,[17] por teste estatístico específico listado a seguir.

Inicialmente foi realizada análise descritiva com cálculo da distribuição de porcentagens para cada variável. As variáveis qualitativas (sexo, dominância, esporte, capsulite intra e pós-operatória) foram analisadas pelo teste de independência Qui-quadrado, quando respeitadas as hipóteses de independência da amostra, e pelo teste exato de Fisher quando não respeitada. Já as variáveis quantitativas e qualitativas ordinais (elevação, rotações medial e lateral, pré e pós-operatória, tempo de seguimento, valor do UCLA e tempo do UCLA) foram analisadas pelo teste não paramétrico de Mann-Withney, quando a distribuição não aderiu à distribuição normal, e pelo teste F, quando houve aderência à distribuição normal, seguido pela análise da igualdade das médias pelo teste T-de-Student.

As análises foram realizadas utilizando-se o programa estatístico Minitab v.17 (Minitab, LLC, State College, PA, EUA),. Foram rejeitadas todas as hipóteses com níveis descritivos (valor de p) inferiores a 0,05, que foi o nível de significância adotado.

O trabalho foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa e aprovado conforme CAAE: 79428617.2.0000.5479.


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Resultados

Utilizando o escore do UCLA,[17] no grupo I tivemos nove resultados excelentes (42%), 8 resultados bons (38%) e 2 resultados insatisfatórios ([Tabela 1]). A média de tempo para reabilitação foi de 6 meses, arco de movimento pós-operatório com elevação média de 142° (110–160°), rotação lateral de 59° (45–70°) e rotação medial de T8 (T3–L5).

Tabela 1

N° de pacientes

Sexo

Idade

Lado dominante

Δtt

UCLA

Δt

COMPLICAÇÕES

1

F

50

03 a.

TOTAL:35

4 m

2

M

70

02 a.

TOTAL: 35

5 m

3

F

49

+

03 a.

TOTAL: 35

5 m

4

F

39

+

02 a.

TOTAL: 35

5 m

5

M

51

+

03 a.

TOTAL: 35

4 m

6

M

43

+

07 a.

TOTAL: 22

9 m

7

M

49

+

02 a.

TOTAL: 35

4 m

8

M

40

+

09 a.

TOTAL: 32

6 m

9

M

34

+

2 a.

TOTAL: 35

5 m

10

M

44

+

09 a.

TOTAL: 32

4 m

11

F

56

09 a.

TOTAL: 31

5 m

12

M

41

+

12 a.

TOTAL: 34

4 m

13

F

54

+

02 a.

TOTAL: 32

9 m

14

M

52

+

09 a.

TOTAL: 31

8 m

15

M

58

04 a.

TOTAL: 23

10 m

16

M

59

+

09 a.

TOTAL: 34

5 m

17

F

53

05 a.

TOTAL: 33

6 m

18

M

44

+

05 a.

TOTAL: 33

4 m

19

M

35

+

07 a.

TOTAL: 33

12 m

REVISÃO PARA LIBERAÇÃO COM 8 MESES DEVIDO CAPSULITE

Já no grupo II, tivemos 5 resultados excelentes (25%), 14 resultados bons (70%) e 1 resultado insatisfatório ([Tabela 2]). A média de tempo para reabilitação foi de 5,2 meses, arco de movimento pós-operatório com elevação média de 146° (130–160°), rotação lateral de 56° (45–70°) e rotação medial de T8 (T5–L2).

Tabela 2

Caso

Sexo

Idade

Lado dominante

Δtt

UCLA

Δt

COMPLICAÇÕES

1

M

58

+

02 a.

TOTAL: 32

6 m

2

F

63

+

02 a, 10m

TOTAL: 31

5 m

3

F

65

+

02 a.

TOTAL: 32

4 m

4

F

67

+

02 a.

TOTAL: 33

5 m

5

M

75

03 a.

TOTAL: 34

4 m

6

F

57

05 a.

TOTAL: 34

6 m

7

M

39

+

08 a.

TOTAL: 32

6 m

8

F

73

+

05 a.

TOTAL: 35

5 m

9

F

59

+

02 a.

TOTAL: 32

5 m

10

M

43

+

04 a.

TOTAL: 32

7 m

11

M

38

+

02 a.

TOTAL: 33

7 m

12

F

29

+

11 a.

TOTAL: 34

4 m

13

M

44

13 a.

TOTAL: 23

6 m

14

M

42

+

02 a.

TOTAL: 32

5 m

15

F

51

08 a.

TOTAL: 33

4 m

16

M

39

+

06 a.

TOTAL: 32

4 m

17

M

49

+

02 a.

TOTAL: 33

4 m

18

M

51

+

03 a.

TOTAL: 32

5 m

19

M

56

+

03 a.

TOTAL: 33

7 m

CAPSULITE COM 3 MESES SENDO REALIZADO BLOQUEIOS E FISIOTERAPIA.

20

F

47

+

02 a.

TOTAL: 35

5 m

Como complicação tivemos dois casos de capsulite adesiva, sendo um em cada grupo. O paciente do grupo I foi submetido à liberação artroscópica após 8 meses do reparo da lesão atingindo o escore UCLA[17] de 33 após 1 ano. O paciente do grupo II apresentou melhora após a realização de bloqueios do nervo supra-escapular e fisioterapia, atingindo o escore UCLA[17] de 33 após 7 meses de pós-operatório.[18]

Após análise estatística, não houve diferença entre o UCLA[16] médio para ambos os grupos, com resultado final de 32, variando para o grupo I de 22 a 35 e o grupo II de 23 a 35. Na análise do tempo necessário para atingir o resultado final do escore UCLA,[17] houve uma diferença de 3 semanas na média, porém sem relevância estatística, com valor de p = 0,336.


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Discussão

O tratamento cirúrgico das LPPAs está indicado na falha do tratamento conservador e comumente nos casos em que a lesão acomete mais de 50% das fibras do tendão,[13] devido a um risco de 40% na progressão para lesão completa, conforme descrevem Mall et al.[12] Mazzoca et al.[19] também demonstraram que nos casos em que há mais de 50% de lesão das fibras do tendão, o tendão remanescente apresenta um aumento de sua tensão, o que levaria a sua eventual ruptura completa.

No ato operatório, ao nos deparamos com LPPA, pode-se abordá-la de duas maneiras em relação ao tendão: ou mantendo sua integridade na inserção – técnica conhecida como fixação transtendão da lesão – ou por uma segunda técnica na qual há a desinserção completa das fibras remanescentes, transformando-a numa lesão completa.

Estudos como de Sethi et al.[20] e Mihata et al.[21] mostram vantagens biomecânicas do reparo transtendão. Nesta técnica, as fibras bursais (intactas e sem lesão) e articulares (contendo a lesão) são suturadas separadamente ([Figura 1]), o que proporciona menor tensão ao final da sutura nas fibras bursais, além de uma maior área de contato na área de inserção. Mas conforme observado por Shin,[22] esses pacientes apresentam um pós-operatório mais doloroso e com uma recuperação do arco de movimento mais lenta, o que poderia estar relacionado a lesões com grande retração da parte articular acometida, ocorrendo um desbalanço entre as fibras reparadas e as que foram mantidas íntegras. Em nosso estudo, observamos que os pacientes do grupo I demonstram um mês a mais na média do tempo de recuperação para atingir o escore UCLA[17] final do que os pacientes do grupo II, mas essa diferença não se mostrou estatisticamente significante.

Shin[22] cita também que a desinserção de toda a margem lateral do manguito rotador, ao transformar a lesão parcial em completa, pode levar ao risco do reparo não anatômico, alterando a biomecânica e assim acarretando uma degeneração precoce do tendão. Porém, em nossa opinião, assim como na de Shin,[22] tal manobra possibilita uma melhor visão e facilita o reparo devido à maior familiaridade com a técnica.[11] [20] Apesar do bom resultado funcional não ser um fator especifico para sabermos se houve ou não reparo anatômico da lesão, não suspeitamos de nenhuma alteração biomecânica importante, visto que os pacientes do grupo II apresentaram boa evolução pós-operatória, com retorno das atividades habituais, assim como encontrado no estudo de Godinho et al.,[23] que obtiveram 100% de satisfação e resultados bons/excelentes com a técnica.

Não há consenso na literatura sobre qual a melhor técnica no reparo desse tipo de lesão. Os trabalhos comparativos entre as duas técnicas, como os de Shin,[22] Ono et al.[24] e Castagna et al.,[16] não apresentam diferenças estatísticas entre elas, apresentando resultados semelhantes no pós-operatório, com a mesma taxa de cicatrização, re-rupturas, e resultados finais. Nosso estudo demonstra que ambas as técnicas possibilitam bons resultados finais, sem diferenças estatísticas ao avaliar o escore UCLA[17] entre os dois grupos, com valor de p = 0,321, inclusive com tempo de reabilitação pós-operatória semelhante, com valor de p = 0,336.

Apesar do bom resultado obtido com as duas técnicas, tivemos em nosso estudo três casos com resultados insatisfatórios, sendo dois do grupo I e um do II. No grupo I, o primeiro paciente tinha 43 anos, era tenista não profissional com lesão acometendo o lado dominante com sintomas por cerca de 20 anos. Com boa mobilidade pré-operatória (140°, 80°, T3), o paciente evoluiu com uma perda no pós-operatório de 110°, 45° e L5, que se manteve. Evoluiu com dor ao executar trabalhos leves, sendo capaz de realizar todas as atividades domésticas, mas com limitação ao realizar movimentos acima da linha do ombro (força grau IV). O segundo caso do grupo I era um paciente de 58 anos, nadador também amador, com sintomas do lado não dominante por 3 anos. Arcos de movimento pré e pós-operatório bons, sem limitação. Evoluiu também com dor ao executar trabalhos leves, com perda grau IV de força acima do ombro. Apesar de tudo, os dois se dizem satisfeitos com o resultado. Já o caso do grupo II era um paciente de 44 anos, sem histórico de prática de esporte, apresentando sintomas há 1 ano. Arco de movimento pré-operatório 160°, 70°, T7. Evoluiu no pós-operatório com dor ao executar trabalhos leves, com discreta diminuição da elevação e rotação lateral, sem perda de força. No entanto este paciente está insatisfeito com o resultado devido à persistência da dor. O que nos chamou atenção nos três casos é que não encontramos uma causa objetiva para a manutenção da dor. Todos os pacientes apresentam exame de imagem mostrando cicatrização normal da lesão.


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Conclusão

Tanto a sutura transtendínea quanto a sutura após completar a lesão levaram a resultados satisfatórios em 93% dos pacientes na nossa série. Não encontramos diferença estatística no tempo de reabilitação entre os dois grupos.


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Conflito de Interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

* Trabalho realizado no Grupo de Cirurgia de Ombro e Cotovelo do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, “Pavilhão Fernandinho Simonsen” (DOT – FCMSCSP) (Diretor: Professora Doutora Maria Fernanda Silber Caffaro), São Paulo/SP, Brasil.


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Endereço para correspondência

Luciana Andrade da Silva, Dra.
Rua Estuário, 519 - Chácara Monte Alegre, São Paulo, SP, 04645-100
Brasil   

Publication History

Received: 06 June 2019

Accepted: 01 December 2020

Article published online:
07 December 2021

© 2021. Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. This is an open access article published by Thieme under the terms of the Creative Commons Attribution-NonDerivative-NonCommercial License, permitting copying and reproduction so long as the original work is given appropriate credit. Contents may not be used for commecial purposes, or adapted, remixed, transformed or built upon. (https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/)

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  • Referências

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Fig. 1 Reparo transtendão da lesão parcial articular do tendão do músculo supraespinal. A - Representação da lesão parcial articular, B - Forma de passagem dos fios de sutura de acordo com esta técnica, C - Lesão suturada.
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Fig. 2 Reparo após transformar a lesão parcial em completa na lesão parcial articular do tendão do músculo supraespinal. A - Representação da lesão parcial articular, B - Lesão parcial sendo completada, C - Forma de passagem dos fios de sutura na lesão já completada, D - Lesão suturada.
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Fig. 1 Transtendon repair of the partial joint lesion of the supraspinal muscle tendon. A - Representation of partial joint injury, B - Way of passage of suture threads according to this technique, C - Sutured lesion.
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Fig. 2 Repair after transforming the partial lesion into complete in the partial joint lesion of the supraspinal muscle tendon. A - Representation of partial joint injury, B - Partial lesion being completed, C - Way of passage of suture threads in the lesion already completed, D - Sutured lesion.