Palavras-chave
analgesia - anestesia por condução - bloqueio nervoso - dor - fraturas do quadril
- ultrassonografia
Introdução
As fraturas do fêmur proximal são frequentes na população idosa.[1] Sua prevalência aumenta frente à crescente longevidade populacional,[2] com incidência mundial estimada para 6,3 milhões de idosos acometidos no ano de
2050.[3]
Trata-se de uma emergência ortopédica associada à significativa mortalidade e morbidade
e requer tratamento cirúrgico bem como analgesia adequada.[3]
[4] Recomenda-se a cirurgia, preferencialmente nas primeiras 24 a 48 horas, por demonstrar
alívio na dor e redução na incidência de complicações pós-operatórias e mortalidade.[5]
[6]
Infelizmente, não é raro encontrarmos, em serviços públicos de emergência, idosos
com fratura de quadril acamados à espera do tratamento cirúrgico definitivo dessas
lesões e apresentando dor de forte intensidade. Neste período pré-operatório, a administração
de opioides para alívio da dor consiste em terapêutica usual, mesmo associada a diversos
efeitos colaterais, como náusea, vômito, constipação, hipotensão, sonolência e alteração
mental. Menos comum, porém ainda mais preocupante, é que alguns pacientes podem desenvolver
delirium, depressão respiratória e morte.[4]
[7] Por outro lado, o temor dessas complicações por parte da equipe médica e de enfermagem
pode elevar o risco de oligoanalgesia. O uso de opioides em idosos deve ser balanceado
tendo em vista seu potencial deletério e a ineficiência quando administrados isoladamente
por via parenteral.[8] O controle inadequado da dor ou uso exagerado de opioide estão diretamente relacionados
ao estado confusional agudo[8] que, por sua vez, quando associado à fratura do quadril, pode praticamente dobrar
a taxa de mortalidade desta população no período de um ano.[9]
Portanto, o tratamento da dor, além de ser questão humanitária, impacta a boa evolução
desses pacientes. A dor está associada ao aumento da resposta ao estresse neuro-hormonal,
isquemia miocárdica e atraso na recuperação e mobilização desses pacientes.[7] A revisão da literatura enfatiza que a analgesia na população idosa deve focar em
minimizar os fatores de risco para o delirium, incluindo a dor, constipação e efeitos colaterais deliriogênicos.[10]
Dentro deste contexto, a anestesia regional para o manejo da dor aguda está cada vez
mais presente nos setores ou departamento de emergência,[8] demonstrando melhor eficácia em comparação à analgesia tradicional disponibilizada
aos pacientes com fratura do quadril.[4] Os bloqueios regionais na região do quadril, efetuados no setor de emergência, demonstraram
benefícios na redução da dor e do uso de opioides, podendo ser recomendados segundo
revisão sistemática.[11] Não obstante, a associação com a ultrassonografia (USG) contribui para a eficiência
desta técnica.[4]
[12]
Para obtenção de analgesia eficaz do quadril, deve-se compreender o aspecto anatômico
da cápsula articular. A região anterior da capsula é inervada por ramos do nervo femoral
(NF), obturatório (NO) e obturatório acessório (NOA), proporcionando a maior contribuição
da inervação sensitiva da articulação do quadril, sugerindo, portanto, que estes devam
ser os principais ramos a serem bloqueados.[13]
[14]
[15] ([Fig. 1] e [2])
Fig. 1 Inervação da região anterior da cápsula articular do quadril. Abreviaturas: NF, nervo femoral; NO, nervo obturatório; NOA, nervo obturatório acessório; NOBA,
nervo obturatório, braço anterior; NOBP, nervo obturatório, braço posterior.[15]
Fig. 2 Inervação da região posterior da cápsula articular do quadril. Abreviaturas: NGI, nervo glúteo inferior; NGS, nervo glúteo superior; NI, nervo isquiático; NQF,
nervo quadrado femoral.[15]
Girón-Arango et al.,[14] baseando-se nesta informação anatômica e considerando que os principais ramos do
NF e NOA são constantemente encontrados entre a espinha ilíaca anteroinferior e a
eminência iliopúbica, descreveram uma técnica de bloqueio desses ramos capsulares
do quadril guiado por USG, conhecida como Pericapsular Nerve Group (PENG) block.
[14]
[15]
[16] ([Fig. 3] e [4])
Fig. 3 Localização anatômica do PENG block em representação tridimensional de hemipelve e quadril direito. Abreviaturas: AF, artéria femoral; EIAI, espinha ilíaca anteroinferior; EIP, eminência iliopúbica;
I, músculo Ilíaco; LI, ligamento inguinal; NF, nervo femoral; NO, nervo obturatório;
NOA, Nervo obturatório acessório; P, Músculo psoas maior; VF, Veia femoral;
Ponto de infusão do anestésico.[15]
Fig. 4 Localização anatômica do PENG block em representação tridimensional de quadril direito (Corte transversal). Abreviaturas: AF, artéria femoral; I, músculo ilíaco; LI, ligamento inguinal; NF, nervo femoral;
NO, nervo obturatório; P, músculo psoas maior; VF, veia femoral;
Ponto de infusão do anestésico.[15]
Evidências de relato do PENG block no pré-operatório de idosos acometidos por fratura do quadril, performado no setor
de emergência de serviço público, são escassas. Neste cenário, o presente estudo considera
que este bloqueio poderia auxiliar na redução da dor e mobilização destes pacientes
em comparação à analgesia sistêmica padronizada.
O objetivo primário deste estudo consiste em avaliar a intensidade da dor nos idosos
acometidos por fratura do quadril internados em setor de emergência e submetidos ao
PENG block no período pré-operatório e, secundariamente, avaliar o grau de flexão tolerável
do quadril acometido.
Material e Métodos
Este ensaio clínico prospectivo, randomizado e controlado, dividido em dois braços
paralelos, foi inscrito na Plataforma Brasil e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
(Protocolo: 38115120.4.0000.5479). O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi
assinado por todos os pacientes ou responsáveis legais. O trabalho foi registrado
sob o número RBR-2zdn8pb no Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (REBEC).
Utilizando-se amostragem probabilística estratificada, os pacientes foram selecionados
de forma sequencial entre idosos internados no setor de emergência de hospital público
com diagnóstico radiográfico de fratura do quadril. Considerou-se um erro tipo I de
0,05 sendo p1 = 0,05 (proporção de indivíduos do grupo controle, com redução da dor ao movimento
em 50% ou mais) e p2 = 0,5 (proporção de indivíduos do grupo intervenção com redução da dor em movimento
de 50% ou mais) e um poder de teste de 0,80. O número total para pesquisa foi de 30
pacientes.[17] No entanto, considerando a taxa de desistência de 5%, o número final ideal para
o estudo correspondeu a 32 pacientes ([Tabela 1]).
Tabela 1
Erro tipo I (α)
|
Poder estatístico (1-β)
|
p1
= 0,05 e p2
= 0,50
|
n
|
n por grupo
|
+5%
|
n
|
n por grupo
|
|
0,80
|
30
|
15
|
32
|
16
|
Ao todo, 59 pacientes com fratura do quadril foram abordados para eventual inclusão
no período de março de 2020 a fevereiro de 2022.
Critérios de Inclusão
Foram incluídos pacientes com idade maior ou igual a 65 anos, independente de gênero
ou nível de cognição, diagnosticados radiograficamente com fratura aguda de colo femoral
do tipo III ou IV baseando-se na classificação de Garden,[18] ou aqueles com fratura transtrocanteriana do tipo III a V segundo a classificação
de Tronzo.[19] Também foram incluídos pacientes classificados pela American Society of Anesthesiology (ASA) como ASA II e III.[20]
Critérios de Exclusão
Foram excluídos pacientes com fraturas crônicas, patológicas, associação com outras
fraturas, limitação prévia da flexão do quadril, antecedentes de alergia ou reações
relatadas ao anestésico utilizado no bloqueio, ou com lesões cutâneas próximas ao
sítio da punção. Excluíram-se, também, pacientes com insuficiência renal ou hepática
avançada, aqueles em uso de anticoagulantes (dose terapêutica) ou distúrbio da coagulação
prévios à fratura, além dos pacientes desacompanhados dos responsáveis legais.
Foram 27 pacientes excluídos e 32 randomizados em quatro blocos por sequência numérica
aleatória gerada por computador[21] e depositada em envelope lacrado. O envelope foi aberto e o sorteio realizado por
um pesquisador não vinculado ao estudo, no momento da internação do participante.
Após o sorteio, pacientes e pesquisadores sabiam o grupo de alocação, tratando-se
de estudo aberto. O PENG block foi realizado apenas pelo pesquisador responsável, enquanto a coleta dos dados pelo
pesquisador e médico residente com treinamento prévio.
Ao todo, 16 pacientes foram alocados em grupo controle e 16 em grupo intervenção.
Ao final, 15 pacientes de cada grupo foram avaliados, totalizando 30 participantes
([Fig. 5]).
Fig. 5 Fluxograma CONSORT 2010.
Variáveis Estudadas
-
Dados sociodemográficos e tipos de fratura.
-
Pontuação da escala Pain Assessment in Advance Dementia (PAINAD) em repouso e movimento.
-
Grau de flexão tolerável do quadril fraturado.
Todos os pacientes foram submetidos ao mesmo formulário que incluía:
-
a) Dados sociodemográficos e clínicos: como idade, gênero, sinais vitais, doenças
pré-existentes, medicações de uso contínuo, tratamento prévio, antecedentes pessoais,
hábitos e vícios, alergia medicamentosa, tipo de fratura, sinais de toxicidade sistêmica,
efeitos adversos, ou complicações.
-
b) Avaliação da dor foi feita com base na escala PAINAD,[22] traduzida e validada, a qual consiste em escala observacional composta por cinco
itens: respiração, vocalização negativa, expressões sociais, linguagem corporal e
consolabilidade. Cada item é classificado de 0 a 2 e, somados, variam entre 0 e 10
pontos.[23]
-
c) Flexão tolerável do quadril: aferida por goniômetro no quadril fraturado durante
a flexão passiva e assistida, com rotação neutra e interrompida por fácies de dor,
resistência ao movimento ou aquele que ocorrer primeiro. A medida mensurada foi inserida
em estratos de flexões de 0 a 15, 16 a 45, 46 a 60 e > 60° ([Fig. 6]).
Fig. 6 Aferição da flexão tolerável do quadril através do goniômetro.
Grupo Controle
Os participantes foram avaliados em repouso e movimento previamente à administração
de qualquer medicação através do formulário da pesquisa com o registro da intensidade
da dor e flexão tolerável do quadril.
Posteriormente, receberam analgesia endovenosa sistêmica (tramadol 100 mg e dipirona
sódica 1g de 8/8h e 6/6h, respectivamente), sendo reavaliado em repouso e movimento
após 45 minutos, 12, 24 e 36 horas.
Grupo Intervenção
Previamente ao bloqueio, este grupo foi avaliado igualmente ao de controle. Posteriormente,
foi encaminhado à sala de procedimento no setor de emergência para realização do PENG block guiado por USG. Após assepsia e antissepsia do quadril fraturado, o pesquisador paramentado
de máscara e luva estéril realizou a colocação de campo e proteção estéril para o
transdutor curvilíneo de baixa frequência do ultrassom modelo HS30, código de identificação
US591 (Samsung Ltd., Suwon, Coréia do Sul) e manutenção regular. Com o paciente em
posição supina, sob visualização ultrassonográfica, identificou-se a espinha ilíaca
anterosuperior (EIAS), espinha ilíaca anteroinferior (EIAI), eminência iliopectínea
(EIP), artéria e veia femorais e tendão do psoas. Referências anatômicas confirmadas,
um botão anestésico foi realizado prosseguindo para introdução de agulha de 100mm
e 22G de lateral para medial passando justa lateral e inferiormente aos psoas alcançando
EIP. Após aspiração negativa excluindo-se a introdução intravascular, 25ml de solução
anestésica de levobupivacaína a 0,25% foram ministrados ([Fig. 7]).
Fig. 7 Ultrassonografia e preparo do paciente para o PENG block. (A) Aparelho de ultrassom utilizado no estudo. (B) Transdutor curvilíneo utilizado no estudo. (C) Região da hemipelve do paciente com campos estéreis para receber o bloqueio. (D). Imagem do ultrassom durante o procedimento. (E). Material utilizado para proceder o PENG block. Abreviaturas: A, ponto de aplicação do anestésico local; AF, artéria femoral; EIAI, espinha ilíaca
anteroinferior; EIAS, espinha ilíaca anterossuperior; EIP, eminência iliopúbica; MP,
músculo psoas maior.
Concluído o PENG block, passados 45 minutos, 12, 24 e 36 horas, aplicou-se novamente o questionário da pesquisa
em repouso e durante o movimento, registrando a intensidade da dor e grau de flexão
tolerável do quadril para cada período avaliado. Este grupo, adicionalmente, recebeu
a mesma analgesia sistêmica do controle.
Desfecho Primário e Secundário
Redução na intensidade da dor ≥ 50% utilizando-se a escala PAINAD no pré-operatório
de idosos com fratura do quadril submetidos ao PENG block e melhora no grau de flexão tolerável do quadril ≥ 45°, avaliado por goniômetro.
Análise Estatística
As características dos pacientes foram apresentadas pelas frequências absolutas e
relativas (para as variáveis qualitativas) e da média, mediana, desvio padrão (DP),
valores mínimo e máximo, assim como o primeiro e terceiro quartis.
A comparação entre grupos independentes foi avaliada pelo teste de Mann-Whitney (variável
quantitativa). A associação entre variáveis qualitativas foi avaliada pelo teste qui-quadrado
de Pearson ou pelo teste exato de Fisher.
Na avaliação das frequências, antes e depois em relação ao grau de flexão, utilizou-se
o teste de McNemar.
O nível de significância adotado foi de 5% para todos os testes de hipóteses e as
análises foram realizadas no software estatístico Statistical Package Social Sciences
(SPSS, IBM Corp. Armonk, NY, USA) para Windows, v.25. Os resultados foram apresentados
de acordo com os objetivos do estudo:
-
Comparação da escala de dor PAINAD entre grupos e tempos.
-
Comparação da variação PAINAD entre os tempos por grupo.
-
Comparação da redução da dor ≥ 50% entre os grupos e tempo.
-
Avaliação do grau de flexão entre os grupos e tempos.
-
Comparação da variação PAINAD e os tipos de fratura.
-
Descrição das características sociodemográficas e clínicas dos participantes do estudo
segundo o tratamento assinado.
-
Representação gráfica dos resultados.
Resultados
As características sociodemográficas e clínicas não apresentaram diferença estatística
significativa ([Tabela 2]).
Tabela 2
Característica
|
Controle
|
Intervenção
|
Total
|
Valor de p
|
n = 15
|
n = 15
|
n = 30
|
n (%)
|
n (%)
|
n (%)
|
Sexo
|
|
|
|
0,999a
|
Feminino
|
12 (80,0)
|
12 (80,0)
|
24 (80,0)
|
|
Masculino
|
3 (20,0)
|
3 (20,0)
|
6 (20,0)
|
|
Idade (anos)
|
|
|
|
0,618c
|
Média (DP)
|
79,5 (11,3)
|
80,9 (9,7)
|
80,2 (10,4)
|
|
Mediana (mín-máx)
|
77 (65–98)
|
82 (65–98)
|
79,5 (65–98)
|
|
Classificação das fraturas
|
|
|
|
0,705b
|
Fraturas transtrocanterianas (extracapsulares)
|
9 (60,0)
|
10 (66,7)
|
19 (63,3)
|
|
Fraturas de colo do fêmur (intracapsulares)
|
6 (40,0)
|
5 (33,3)
|
11 (36,7)
|
|
Ao avaliar a dor na escala PAINAD para cada grupo de tratamento e período considerado,
verificou-se que na internação (período no qual não há medicação ou bloqueio) não
houve diferença significativa entre os grupos. Em contraste, após administração medicamentosa
ou PENG block, verificou-se diferença significativa entre os grupos (p < 0,05) para todos os períodos avaliados (45min, 12, 24 e 36h), tanto em repouso
quanto em movimento (p ≤ 0,05) ([Tabela 3]).
Tabela 3
Característica
|
|
Controle
|
Intervenção
|
Valor de p
a
|
|
n = 15
|
n = 15
|
|
n (%)
|
n (%)
|
Repouso
|
|
|
|
|
Internação
|
Média (DP)
|
2,0 (1,3)
|
1,7 (1,6)
|
0,464
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
2 (1–3)
|
1 (1–3)
|
|
45 minutos
|
Média (DP)
|
1,7 (1,2)
|
0,5 (0,8)
|
0,001
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
1 (1–2)
|
0 (0–1)
|
|
12 horas
|
Média (DP)
|
1,9 (1,4)
|
0,3 (0,8)
|
<0,001
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
2 (1–3)
|
0 (0–0)
|
|
24 horas
|
Média (DP)
|
2,0 (1,5)
|
0,3 (0,8)
|
0,001
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
2 (1–3)
|
0 (0–0)
|
|
36 horas
|
Média (DP)
|
2,0 (1,5)
|
0,9 (1,2)
|
0,046
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
2 (1–3)
|
1 (0–1)
|
|
Movimento
|
|
|
|
|
Internação
|
Média (DP)
|
6,2 (1,5)
|
7,3 (1,5)
|
0,051
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
6 (5–8)
|
8 (6–8)
|
|
45 minutos
|
Média (DP)
|
6,1 (1,2)
|
3,6 (2,1)
|
0,001
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
6 (5–7)
|
3 (2–5)
|
|
12 horas
|
Média (DP)
|
6,5 (1,2)
|
3,1 (2,0)
|
<0,001
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
6 (5–7)
|
3 (2–4)
|
|
24 horas
|
Média (DP)
|
6,5 (1,2)
|
3,8 (1,6)
|
<0,001
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
6 (6–7)
|
4 (2–5)
|
|
36 horas
|
Média (DP)
|
6,3 (1,3)
|
4,3 (1,1)
|
0,001
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
6 (5–7)
|
4 (4–5)
|
|
Ao comparar a variação PAINAD, no momento da internação, com os tempos pós-medicação
ou bloqueio, verificou-se, em repouso, diferença estatística entre os grupos (p ≤ 0,05), exceto no comparativo de internação com 36 horas. Na avaliação em movimento,
houve diferença estatística entre os grupos, para todos os tempos comparados à internação
(p < 0,001) ([Tabela 4]).
Tabela 4
Comparação
|
Controle
|
Intervenção
|
Valor de p
a
|
Repouso
|
Internação
|
45 minutos
|
Média (DP)
|
-0,27 (0,80)
|
-1,20 (1,32)
|
0,044
|
|
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
0 (-1; 0)
|
-1 (-2; 0)
|
|
|
|
12 horas
|
Média (DP)
|
-0,07 (1,16)
|
-1,47 (1,36)
|
0,008
|
|
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
0 (-1; 1)
|
-1 (-2; 0)
|
|
|
|
24 horas
|
Média (DP)
|
0 (1,00)
|
-1,40 (1,35)
|
0,004
|
|
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
0 (-1; 1)
|
-1 (-2; 0)
|
|
|
|
36 horas
|
Média (DP)
|
0 (1,60)
|
-0,80 (1,37)
|
0,117
|
|
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
0 (-1; 1)
|
0 (0; 1)
|
|
Movimento
|
Internação
|
45 minutos
|
Média (DP)
|
-0,13 (0,74)
|
-3,73 (1,79)
|
<0,001
|
|
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
0 (0; 0)
|
-4 (-4; -2)
|
|
|
|
12 horas
|
Média (DP)
|
0,27 (0,96)
|
-4,27 (2,19)
|
<0,001
|
|
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
0 (0; 1)
|
-4 (-5; -3)
|
|
|
|
24 horas
|
Média (DP)
|
0,33 (1,23)
|
-3,53 (1,85)
|
<0,001
|
|
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
1 (0; 1)
|
-4 (-4; -2)
|
|
|
|
36 horas
|
Média (DP)
|
0,07 (1,53)
|
-3,00 (1,41)
|
<0,001
|
|
|
|
Mediana (Q1-Q3)
|
0 (-1; 1)
|
-3 (-4; -2)
|
|
Uma redução do quadro álgico em 50% ou mais foi pesquisada entre os grupos e os tempos
de avaliação. O grupo controle avaliado em repouso demonstrou redução desejada da
dor (≥ 50%) em 13,3, 20, 13,3 e 20% dos pacientes, respectivamente ao tempo de avaliação
(45 min, 12, 24 e 36h). O grupo intervenção apresentou no respectivo período 46,7,
66,7, 60 e 33,3% dos pacientes com melhora da dor desejada (≥50%), com uma diferença
significativa para o período de 12 e 24 horas (p < 0,05).
Durante movimento, nenhum paciente do grupo controle obteve redução na dor ≥ 50%.
O grupo intervenção, por sua vez, demonstrou redução do quadro álgico em 40, 60, 40
e 20% dos pacientes, respectivamente, com o período 45 minutos, 12, 24 e 36 horas
(p ≤ 0,05, exceto em 36 horas) ([Tabela 5], [Fig. 8]).
Fig. 8 Representação gráfica: porcentagem dos pacientes com melhora na dor ≥ 50% em repouso
e movimento segundo grupo de tratamento e período de avaliação.
Tabela 5
|
Internação
|
PAINAD
|
Controle
|
Intervenção
|
Valor de p
a
|
Repouso
|
45 min
|
<50%
|
13 (86,7)
|
8 (53,3)
|
0,109
|
|
|
≥50%
|
2 (13,3)
|
7 (46,7)
|
|
|
12 h
|
<50%
|
12 (80,0)
|
5 (33,3)
|
0,025
|
|
|
≥50%
|
3 (20,0)
|
10 (66,7)
|
|
|
24 h
|
<50%
|
13 (86,7)
|
6 (40,0)
|
0,021
|
|
|
≥50%
|
2 (13,3)
|
9 (60,0)
|
|
|
36 h
|
<50%
|
12 (80,0)
|
10 (66,7)
|
0,682
|
|
|
≥50%
|
3 (20,0)
|
5 (33,3)
|
|
Movimento
|
45 min
|
<50%
|
15 (100)
|
9 (60,0)
|
0,017
|
|
|
≥50%
|
0
|
6 (40,0)
|
|
|
12 h
|
<50%
|
15 (100)
|
6 (40,0)
|
0,001
|
|
|
≥50%
|
0
|
9 (60,0)
|
|
|
24 h
|
<50%
|
15 (100)
|
9 (60,0)
|
0,017
|
|
|
≥50%
|
0
|
6 (40,0)
|
|
|
36 h
|
<50%
|
15 (100)
|
12 (80,0)
|
0,224
|
|
|
≥50%
|
0
|
3 (20,0)
|
|
Em relação à flexão tolerável do quadril, observou-se diferença estatística entre
os grupos e seus devidos tempos (p < 0,05) ([Tabela 6], [Fig. 9]).
Fig. 9 Representação gráfica da frequência do grau de flexão tolerável do quadril (0–15,
16–45, 46–60 e >60°) em relação ao grupo e período de tratamento.
Tabela 6
Característica
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Controle
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Intervenção
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Valor de p
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n = 15
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n = 15
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n (%)
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n (%)
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Internação
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Flexão tolerável do quadril aferida em graus
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Média (DP)
Mediana (Q1-Q3)
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20,7 (8,8)
20 (15–20)
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13,9 (10,5)
10 (8–15)
|
0,022a
|
Grau de flexão
|
0–15
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5 (33,3)
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12 (80,0)
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0,010c
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16–45
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10 (66,7)
|
3 (20,0)
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45 minutos
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Flexão tolerável do quadril aferida em graus
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Média (DP)
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20,3 (8,5)
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47,0 (14,6)
|
<0,001a
|
Mediana (Q1-Q3)
|
20 (15–25)
|
45 (40–60)
|
|
Grau de flexão
|
0–15
|
5 (33,3)
|
0
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0,002b
|
|
16–45
|
10 (66,7)
|
8 (53,3)
|
|
|
46–60
|
0
|
6 (40,0)
|
|
|
>60
|
0
|
1 (6,7)
|
|
12 horas
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|
|
|
|
Flexão tolerável do quadril aferida em graus
|
Média (DP)
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19,0 (10,2)
|
49,7 (10,1)
|
<0,001a
|
Mediana (Q1-Q3)
|
20 (10–30)
|
50 (45–60)
|
|
Grau de flexão
|
0–15
|
7 (46,7)
|
0
|
<0,001b
|
|
16–45
|
8 (53,3)
|
5 (33,3)
|
|
|
46–60
|
0
|
10 (66,7)
|
|
24 horas
|
|
|
|
|
Flexão tolerável do quadril aferida em graus
|
Média (DP)
|
18,7 (9,3)
|
42,7 (10,5)
|
<0,001a
|
Mediana (Q1-Q3)
|
20 (10–25)
|
45 (40–50)
|
|
Grau de flexão
|
0–15
|
7 (46,7)
|
0
|
0,002b
|
|
16–45
|
8 (53,3)
|
11 (73,3)
|
|
|
46–60
|
0
|
4 (26,7)
|
|
36 horas
|
|
|
|
|
Flexão tolerável do quadril aferida em graus
|
Média (DP)
|
19,2 (8,2)
|
43,3 (11,3)
|
<0,001a
|
Mediana (Q1-Q3)
|
15 (15–25)
|
45 (40–50)
|
|
Grau de flexão
|
0–15
|
8 (53,3)
|
1 (6,7)
|
0,011b
|
|
16–45
|
7 (46,7)
|
10 (66,7)
|
|
|
46–60
|
0
|
3 (20,0)
|
|
|
>60
|
0
|
1 (6,7)
|
|
Em relação à dor e tipo de fratura estudada, não houve diferença entre os grupos ([Fig. 10]).
Fig. 10 Representação gráfica da variação da dor (PAINAD) entre os tipos de fratura, grupo
de tratamento e tempo avaliado.
Discussão
Neste estudo foi possível demonstrar que o PENG block realizado no setor de emergência proporcionou analgesia significativa em idosos com
fratura do quadril no pré-operatório quando avaliados tanto em repouso quanto em movimento,
além de favorecer o grau de flexão tolerável do quadril fraturado.
Técnicas de bloqueio analgésico do quadril evidenciaram efeito apenas moderado, não
abrangendo adequadamente o nervo obturatório.[24] Diretrizes internacionais questionam se esses bloqueios são relevantes quando comparados
à analgesia sistêmica.[25]
Girón-Arango et al.,[14] em 2018, demonstraram com sua técnica inovadora que o PENG block, quando utilizado em fraturas do quadril, proporcionou redução significativa da dor.[14] Posteriormente, ensaios clínicos corroboraram com resultados semelhantes.[26]
[27] Essa técnica apresentou baixa complexidade e risco envolvido, verificando segurança
e eficácia e proporcionando menor bloqueio motor.[28] Mesmo assim, devemos estar atentos aos argumentos quanto à necessidade de mais ensaios
clínicos para verificar a segurança do método.[29]
Nosso estudo selecionou o PENG block considerando seu embasamento anatômico e seu desenvolvido objetivando analgesia em
fraturas do quadril com excelentes resultados preliminares, sendo um método tecnicamente
simples e passível de aplicação no setor de emergência. Os relatos de sua utilização
no setor de emergência para idosos com fratura do quadril no pré-operatório ainda
são escassos e nosso estudo corrobora com esta prática.
Experiências de dor em idosos são complexas, multidimensionais e requerem gestão multidisciplinar.[30] Ao realizar um estudo para o tratamento da dor, recomenda-se a utilização de apenas
uma escala de aferição. Deve-se ter em mente qual a redução clinicamente significativa
é ideal para o tratamento da dor e calculá-la utilizando redução percentual e não
absoluta. Desta forma, redução álgica de 30 a 33% é considerada como clinicamente
significativa.[31]
[32]
[33]
[34]
[35]
Mesmo utilizando método mais rigoroso, considerando redução da dor clinicamente significativa
de 50% ou mais, foi possível demonstrar que, em repouso, no período de 12 horas, mais
de 65% dos pacientes submetidos ao PENG block alcançaram o objetivo, em contraste com 20% dos pacientes do grupo controle. Em movimento,
no mesmo período, 60% dos pacientes do grupo intervenção reportaram redução de dor
igual ou maior que 50%, mas ninguém do grupo controle apresentou o mesmo.
O estudo também objetivou a melhora no grau de flexão tolerável do quadril (≥ 45°),
favorecendo maior mobilidade e conforto e, consequentemente, facilitando a assistência
aos cuidados básicos como higiene e alimentação. Observou-se excelente resultado,
principalmente no período de 12 horas após o bloqueio, com mais de 66% dos pacientes
do grupo intervenção demonstrando flexões do quadril de 46 a 60°, contrastando com
nenhum paciente controle.
Conclusão
Idosos com fratura do quadril que receberam o PENG block como analgesia adicional no pré-operatório experimentaram nível reduzido de dor e
melhor grau de flexão tolerável do quadril em comparação àqueles que receberam somente
analgesia sistêmica endovenosa, padronizada. Esse método deve ser considerado na analgesia
pré-operatória de idosos com fratura do quadril que aguardam tratamento cirúrgico
definitivo.