Palavras-chave
articulação acromioclavicular - fixação de fratura - luxações articulares
Introdução
A luxação acromioclavicular (LAC) ocorre em 6% das luxações, sendo a segunda mais
comum na cintura escapular.[1] A LAC pode estar associada a fraturas da clavícula; porém, estas podem ser em seu
terço medial, médio ou lateral. A ocorrência de LAC associada a fraturas da extremidade
lateral é baixa; no entanto, quando há também um deslocamento do fragmento lateral
da clavícula em relação ao acrômio, torna-se ainda mais infrequente.
O mecanismo do trauma da LAC é geralmente ocasionado pela queda sobre o ombro com
o braço em adução. Sua frequência é de 5 a 10 vezes maior no sexo masculino.[2]
O tratamento varia conforme o grau da luxação, e também de acordo com a associação
de fraturas ipsilaterais da clavícula. Entre as opções de tratamento cirúrgico, são
descritas fixação com parafuso coracoclavicular, amarrilho com âncora, Endobutton
ou placa gancho.
A LAC é classificada em seis tipos de acordo com Rockwood.[3] Já as fraturas da extremidade lateral da clavícula têm várias classificações, entre
as quais a mais citada é a de Robinson.[3] Fratura da extremidade lateral da clavícula associada a LAC é uma patologia muito
rara e não está incluída nos sistemas de classificação propostos, sendo descrita apenas
por um autor na língua inglesa[4] e outro em alemão.[5]
Diante do histórico apresentado, o objetivo do presente trabalho é descrever um caso
raro de fratura da extremidade lateral da clavícula com luxação do fragmento fraturado
para a musculatura do trapézio.
Relato do Caso
Trata-se de um paciente de 40 anos, sexo masculino, que sofreu queda de bicicleta
com trauma direto do ombro ao solo.
O exame clínico inicial mostra muita dor local, deformidade com infradesnivelamento
do ombro e exame radiográfico evidenciando a fratura da extremidade lateral da clavícula,
luxação com distanciamento do fragmento em relação ao acrômio e aumento do espaço
coracoclavicular ([Fig. 1]).
Fig. 1 Exame radiográfico mostrando a fratura da extremidade lateral da clavícula com luxação
deste fragmento para longe do acrômio, e aumento do espaço coracoclavicular.
Devido à dor intensa e deformidade local, o paciente foi operado após 2 dias. Foi
realizado um acesso sobre a articulação acromioclavicular (AAC) em direção à diáfise
da clavícula, retirado o fragmento ósseo da extremidade lateral da clavícula na musculatura
do trapézio, que estava totalmente solto dos ligamentos, e foi feita a osteossíntese
utilizando fios de Steinmann, amarrilho com fios de aço e inserida uma âncora de 5 mm
no coracoide com fios Fiber Wire[1] amarrados à clavícula para redução do espaço coracoclavicular. Não foi realizada
fixação da AAC devido ao risco de fragmentação.
Após 3 semanas de operado, o paciente retornou com dor e deformidade no ombro, informando
ter ocorrido após um esforço físico. A radiografia apresentou aumento do espaço coracoclavicular
por rompimento dos fios da âncora e consequente nova LAC, conforme radiografia ([Fig. 2]).
Fig. 2 Radiografia apresentando aumento do espaço coracoclavicular por rompimento dos fios
da âncora e consequente nova LAC.
Em seguida, o paciente foi reoperado, e então foi refeita a osteossíntese, dessa vez
com placa bloqueada, novo amarrilho coracoclavicular com outra âncora do mesmo tipo
associada a amarrilho feito sobre a placa bloqueada. Para maior segurança no procedimento,
foi fixada a clavícula à espinha da escápula com um fio de Steinmann, o qual foi retirado
após 6 semanas ([Fig. 3]).
Fig. 3 Osteossíntese com placa bloqueada, novo amarrilho coracoclavicular com outra âncora,
amarrada sobre a placa bloqueada. Fixação da clavícula à espinha da escápula com um
fio de Steinmann.
No último retorno, 12 meses após a cirurgia, já sem queixas de dor e sem perda funcional,
foi realizado novo controle radiológico que mostrou consolidação da fratura e sem
sinais de osteonecrose do fragmento ([Fig. 4]). Exame clínico mostrou amplitude de movimentos preservados e sem dor ([Fig. 5]).
Fig. 4 Radiografia 12 meses após a cirurgia mostrando consolidação da fratura e sem sinais
de osteonecrose.
Fig. 5 Exame clínico mostra amplitude de movimentos preservados e sem dor.
Discussão
Nossa pesquisa encontrou apenas um artigo com o mesmo caso do nosso paciente.
Borus et al.[4] descrevem caso idêntico a este; porém, não foi possível acessar o trabalho, apesar
de várias tentativas de obtê-lo, incluindo solicitação via e-mail para o autor.
Siebenbürger et al.[5] publicaram um relato de caso em que o paciente teve uma fratura da extremidade lateral
da clavícula e luxação acromioclavicular associada, mas o fragmento fraturado não
desviou totalmente da metáfise da clavícula, conforme o presente caso relatado. Assim,
o tratamento realizado foi redução incruenta da fratura e fixação via artroscópica
com Endobutton, obtendo resultado satisfatório.
A literatura descreve casos de LAC associada a fraturas da diáfise[6]
[7]
[8] e extremidade medial da clavícula,[9]
[10] com vários tipos de tratamentos propostos, mas nenhum deles se assemelham ao presente
caso.
O ponto crítico é que o paciente infelizmente necessitou de duas cirurgias devido
à intercorrência de rotura dos fios da âncora. Acreditamos que a soltura ocorreu por
não haver nenhuma fixação acessória. Por isso, em sua segunda cirurgia, foi alterado
o método de osteossíntese por placa bloqueada e além do amarrilho com âncora foi fixada
a clavícula à espinha da escápula, obtendo assim melhor estabilidade.
Acreditamos que as fraturas com desvio da extremidade lateral da clavícula e lesão
associada dos ligamentos acromioclaviculares devem ter fixação acessória da clavícula
ao acrômio ou à espinha da escápula, e não somente por meio de amarrilhos ao coracoide.